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Em 7 de dezembro de 1967, o Superior Tribunal Militar julgou processos que envolviam brasileiros que se opuseram ao golpe empresarial-militar de 1964. Quase todos foram absolvidos, reconhecida a legitimidade de sua resistência àquela agressão à democracia. O editor deste blog foi um, das dezenas de beneficiafos com o habras-corpus unanimemente concedido. Do plenário daquela corte participavam, dentre outros, os oficiais-generais Ernesto Geisel, Peri Beviláqua, Rademaker Grünewald, Grum Moss, Olímpio Mourão Filho e outros, além de cinco ministros civis. Lembre-se que o então Presidente daquela corte, Mourão Filho, foi o militar que precipitou o golpe de 1964, deslocando suas tropas de Juiz de Fora. O AI-5, mais tarde estimulador da tortura e do assassinato de tantos democratas, ainda não fora decretado. Foi, portanto, obedecida a legislação em vigor, como se pode esperar

a sujeição da maioria dos atuais membros do STF às disposições constitucionais e legais ora vigentes. Há quem preveja a negativa da cassação das patentes, com a reiteração de prática assaz conhecida no ambiente castrense. A rigor, dela acabou resultando o processo que levou à condenação por completar na justiça especializada, de que o STM é a instância máxima. O corporativismo pode calar-se, levando à cassação das patentes, sobretudo pela responsabilidade das forças armadas na defesa da soberania e do território. Tanto quanto se sabe, em relação à soberania, outra coisa não tem feito um dos filhos do principal condenado, que incitar governo estrangeiro a agredir o Brasil e constranger sua população. Com financiamento do próprio pai, ninguém ignora isso. Se a falta de dignidade é suficiente para excluir das forças quem não a ostenta, a volumosa prova dos delitos praticados é suficiente e vigorosa. Sem esquecer quanto todos - os condenados e os brasileiros - teríamos ganho, se a exclusão do indigno-mor ocorresse na primeira manifestação de sua indiscutível vocação para o crime. Os autos, de ontem e de hoje, dizem mais.

 
 
 

Interessante e esclarecedor artigo de Alexandre Borges indica outros oficiais legalistas, aos quais coube importante papel na resistência ao golpe de estado. O texto pode ser lido na página ESPAÇO ABERTO. Saudemo-los, portanto!

 
 
 

Alexandre Borges*



O autor Nassim Nicholas Taleb notou que o mundo celebra protagonistas de grandes eventos, mas ignora quem impede tragédias. Heróis silenciosos são aqueles abnegados que evitam um desastre e salvam vidas que nem sabiam que estavam em risco. Na tentativa frustrada de golpe no Brasil, muitos patriotas de verdade merecem ser lembrados.

O país acompanhou ontem as prisões de generais envolvidos na conspiração que não virou ruptura institucional porque alguns suportaram difamação, assédio e todo tipo de pressão e, mesmo assim, se recusaram a violar a Constituição. Vão dizer que não fizeram mais que a obrigação, mas foram além.

O general Marco Antônio Freire Gomes é o símbolo maior dessa resistência.

Comandante do Exército entre março e fim de 2022, ele havia sido nomeado para o posto após Paulo Sérgio Nogueira ser escolhido para o Ministério da Defesa. Em 7 de dezembro, na reunião em que foi apresentada a minuta do golpe, Freire Gomes disse claramente que o Exército não participaria de qualquer quartelada e chegou a avisar Jair Bolsonaro de que, se insistisse, o presidente receberia voz de prisão.

A partir daí, Freire Gomes foi alvo de uma campanha organizada de ataques. Recebeu mensagens questionando sua honra e sua lealdade ao país, ameaças veladas e pressão de antigos colegas. Um oficial da reserva chegou a chamar o legalista de traidor e a enviar fotos de familiares para intimidar. Freire Gomes se manteve firme.

Outro pilar da resistência foi o tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, comandante da Aeronáutica. No dia 14 de dezembro, Baptista Junior participou de uma reunião convocada pelo ministro Paulo Sérgio em que a famigerada minuta golpista foi apresentada. Ele se levantou e saiu da sala, deixando claro que também a Aeronáutica não entraria na aventura golpista.

A partir daquele momento, passou a ser hostilizado diariamente nas redes bolsonaristas, rotulado de "melancia" e acusado de "comunista". Não havia nada de espontâneo ou orgânico nesses ataques. As investigações da Polícia Federal revelaram que o general Walter Braga Netto orientou influenciadores a atacarem Baptista Junior e sua família.

A mesma máquina de intimidação atingiu outros oficiais generais do Alto Comando do Exército. O General Tomás Miguel Ribeiro Paiva, comandante militar do Sudeste, foi alvo de mensagens que pretendiam enlamear sua imagem publicamente apenas por defender o papel constitucional das Forças Armadas.

O general André Luis Novaes Miranda, comandante militar do Leste, também foi vítima dessa ofensiva digital organizada. O general Valério Stumpf, chefe do Estado-Maior do Exército, enfrentou acusações falsas e difamações fabricadas.

O general Richard Fernandez Nunes, comandante militar do Nordeste e também legalista, foi mais um atingido pelo mesmo padrão de agressões. E o general Guido Amin Naves, que chefiava o Departamento de Ciência e Tecnologia do Exército e coordenou o relatório técnico das Forças Armadas enviado ao Tribunal Superior Eleitoral, foi atacado por simplesmente registrar que não havia fraude nas urnas. Nenhum desses oficiais cedeu.

Um ano antes, outro servidor público já havia agido para impedir que o ambiente institucional se deteriorasse. Outro herói de quem você nunca ouvir falar, mas que, sem ele, a história poderia ser outra.

O procurador militar Armando Brasil Teixeira, atuando no Pará, identificou risco concreto de policiais militares armados circularem nas manifestações convocadas por Jair Bolsonaro para o 7 de setembro de 2021.

Armando Brasil Teixeira exigiu das corregedorias da PM e do Corpo de Bombeiros paraenses planos de contingência, regras claras e medidas disciplinares para evitar que a corporação fosse usada como massa de manobra. Ele também entrou em contato direto com pares no Brasil inteiro, recomendando que fizessem o mesmo e fornecendo subsídios para as petições.

Ele fez tudo isso discretamente, sem buscar reconhecimento e sabendo que seria criticado por setores radicalizados. O fato é que, naquele dia, não houve confronto armado envolvendo agentes públicos. Os golpistas armados haviam sido desmobilizados.

Também merecem destaque os policiais que enfrentaram a violência extrema de 8 de Janeiro.

O segundo-tenente Marco Teixeira, do pelotão Patamo Alfa da Polícia Militar do Distrito Federal, liderou cerca de vinte policiais que tentaram conter uma multidão que avançava sobre a Praça dos Três Poderes. Sua tropa ficou exposta, sem reforço adequado, e mesmo assim manteve posição.

A cabo Marcela da Silva Morais Pinno foi agredida brutalmente, jogada da cúpula do Congresso e quase teve sua arma tomada. Sua promoção por bravura não registra nem de longe o custo físico e psicológico daquele dia.

O que ficou evidente é a distância moral entre quem planejou a ruptura e quem impediu.

De um lado, generais agora presos por ordenar ataques, assinarem documentos golpistas, promoverem intimidação e articularem a derrubada de um governo eleito.

Do outro, profissionais que, sem garantias de proteção, defenderam a legalidade sem alarde e sem expectativa de reconhecimento. A lógica de Taleb se confirma: ninguém erguerá monumentos a esses servidores, porque o desastre que evitaram nunca aconteceu.

Este artigo cita apenas alguns. Há muitos outros, civis e militares, que não aparecem em inquéritos, reportagens ou decisões judiciais, mas que atuaram dentro de suas funções para impedir a ruptura institucional.

A eles também presto reverência. São brasileiros que honraram a Constituição quando isso significava enfrentar pressão política, risco pessoal e ataques à própria reputação. São os heróis silenciosos que impediram o golpe de 2022.

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*Colunista do UOL. 25/11/2025

 
 
 
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