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Os que temos vivido as últimas décadas (no caso do redator, oito) somos privilegiados. Não que tenhamos acumulado fortuna de que nossos sempre parcos ou eventualmente generosos salários o tenha permitido. Ou a reserva de direitos de que não desfruta a maioria da população. Afinal, nem todos estamos em condições de legislar em causa própria, tomar o Erário como propriedade de nossas famílias ou tecer relações promíscuas com os que pensam tudo poder comprar. O privilégio a que me refiro dirige-se à capacidade de, olhos e mentes abertos, sermos capazes de captar a realidade diante de nós, sem peias que nos impeçam de refletir e chegar a alguma conclusão plausível. Mesmo que sujeita à crítica, porque sempre haverá profetas de coisas consumadas à espreita. Assusta-nos a desfaçatez com que são feitas certas cobranças, pela origem delas e pelo histórico que pesa sobre próprias posições e condutas dos seu autores. A realidade acaba por apresentar aspectos que, não fora a tragédia que os reveste, beiram o ridículo. Por isso, não merecem, se não o deboche de uma sonora gargalhada, o sorriso maroto ou o esgar de desdém. Nesse caso, o protagonismo vem da Organização das Nações Unidas, esse órgão que lembra a coragem dos bravateiros, incapaz de exercer-se contra quem tem algum poder. Ao mesmo tempo em que o Estado de Israel soma novas às inúmeras desobediências a determinações da organização, a ONU reclama das condições de segurança que cercam a COP30. É como se o irmão violento e (por isso, e só por isso!) grandalhão ameaçasse o opositor de seu irmão menor, fugindo da raia, logo que o irmão maior ainda do outro chegasse no lugar da briga. Se, ao longo do seu percurso, a sucessora da Liga das Nações se tivesse comportado com a firmeza, a decência e a distância da riqueza e do poder de terceiros, sequer se cogitaria de substituí-la por outra instância em que a Paz e a Humanidade constituíssem o móvel de sua existência. Não sendo isso o que se registra, melhor é dar uma gargalhada. Ou lançar o esgar diante do ridículo. Ou inventar a sucessora da ONU.

 
 
 

Estranho a ocupação dos espaços nos jornais impressos, nos comentários de rádio e televisão e nas diversas redes que disseminam notícias (muitas vezes, falsas notícias), por análises no mínimo suspeitas. Algumas vezes, tendenciosas ao limite. Élio Gaspari, por exemplo, chega ao ponto de quase comparar a conduta do ex-Presidente condenado a 27 anos de prisão ao general (também traidor de sua pátria) Pétain, que morreu, octagenário, na cadeia. O que aproxima um do outro, é o fato de terem ambos cometido crimes. Nada mais. Outro ponto em que certos comentaristas insistem, é a tentativa de mostrar as diferenças entre a reação e a conduta de Lula e a de seu mais feroz opositor, como se se tratasse de personalidades comparáveis. Como se água e vinho pudessem ser comparados em substância. Neste caso, poderíamos dizer existir a metáfora do copo, cheio de bons sabores ou apenas vazio de qualquer coisa. O copo e a cabeça. O coração, também. Reduzir tudo à questão da violência e à necessidade indiscutível de combate-la, igualmente me parece pouco. Como é pouco pedir que Lula procure atualizar-se com a realidade mundial e seus reflexos no ambiente interno, impossível de ignorar o fenômeno da globalização e seus efeitos sobre todo o Planeta. Mais que isso, a pauta apresenta-se errada, sobretudo por que finge ignorar as relações, seja do ponto de vista sensível à globalização, seja sob a perspectiva essencialmente nacional. A História Universal conforma-se no campo da diplomacia, mas as vantagens que as guerras produzem para alguns têm-nas feito preferidas pelos que dispõem mais de armas que de ideias e valores realmente humanos. Internamente, não faltam críticos ao exagerado apego à conciliação, que nos tem feito perder excelentes oportunidades de tornar menos injusta e discriminatória a sociedade brasileira. Resumo, repetindo comentário recentemente publicado em A Crítica, de Manaus (O melhor resultado da COP, 13-1--2025). Tanto quanto todos podem observar, o atual sistema de produção e a distribuição da riqueza dele advinda só têm aumentado a desigualdade. Este, na verdade, o grande - e talvez único - problema a ser debelado. O resto restará como consequência relativamente fácil de controlar, evitar e remover. Por que não há mais advogados dessa tese? Na mesma medida em que a sociedade produz o homem que a integra, o conjunto destes é que produz a sociedade. Um adendo, apenas: a POLÍTICA é a forma mais adequada ao tratamento das diferenças e da superação das desigualdades naturais, mas também é aquela em que a VONTADE, pessoal e coletiva, pode levar à realidade que todos dizem combater - grande parte, hipocritamente -, sem que façam menos que aprofundar a perversidade e a discriminação reinantes. Disso, quase ninguém tem tratado. O pequeno número dos que tratam recebem a resposta pelos caminhos da pura e simples extinção e da mentira.

 
 
 

Está cada vez mais difícil ser oposição no Brasil. A razão não vem de qualquer violência ou pressão exercida pelo governo sobre os pretensos opositores. Na verdade, depois de um período em que tudo foi tentado para proteger a famiglia dos governantes e os que a ela se assemelham, a tolerância e o respeito ao devido processo legal foi o caminho preferido. A busca de transformar a Polícia Federal em não mais que uma réplica dos tonton-macoute haitiano deu com os burros (mesmo os que andam sobre duas patas apenas) n'água. Depois, o uso de membros do Poder Judiciário e mesmo do Ministério Público Federal, em aliança conhecida como a república de Curitiba, só fez desacreditar o discurso de que as abundantes fake-news disseminadas dá (péssima, porque vergonhosa) notícia. Tantas foram as estrepolias, sempre ofensivas ao Estado Democrático de Direito patrocinadas, financiadas, inspiradas e executadas pela oposição direitista, que o clímax não poderia levar a outro destino. Se são oito os membros do que as autoridades policiais e judiciárias chamam núcleo crucial dos crimes, outros desses grupos vêm merecendo o tratamento que só as democracias podem dispensar aos que ousam rompê-la. O 8 de janeiro de 2023 diz muito mais do que os autos de todos os processos a ele relacionados comprovam. Há que ser dito, nos livros de História, a quanto pode chegar o ser humano, quando lhe falta não apenas a escolaridade que alguns elitistas reivindicam como determinante da qualidade dos animais ditos superiores. Pior para os grupos que alimentam seus sonhos com o ódio e a mentira. Se é que seus espíritos tacanhos, desprovidos de qualquer das condições que Hannah Arendt indica como características do ser humano, têm a capacidade de sonhar... Essa a principal razão por que os cúmplices de ontem travestiram-se de delatores; os associados da súcia disputam descarada e ostensivamente espólio que pertence a um cadáver político, não faltando ainda os que tratam de salvar-se pelo menos a si mesmos, diante da ameaça que sempre pairará sobre seus ombros, tantas as ilicitudes em que se terão envolvido. É difícil, assim, permanecer na oposição. Mas isso não é tudo, como todos veremos. Muito mais coisa de que se envergonhará a geração atual, principalmente os que dispõem de condições de comparar, quanto mais se forem definindo os rumos deste país. As bravatas do Presidente norte-americano, endeusado pela oposição, dia-a-dia são desmascaradas. O rugido do que parecia leão não tem som mais alto que o ruído das catitas, no trajeto do buraco até o queijo. Não que faltem oportunidades aos dessa espécie de roedores, mas pela fragilidade política e moral do objeto de sua subserviente adoração. Não precisa lembrar, mas não é demasia dizer: mais um dos membros da família está às voltas com a polícia e a justiça. Não se faz um anel de ouro com pedaços de madeira.

 
 
 
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