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Li em algum lugar que se o diabo existe, sua obra-prima é o banco. Único negócio capaz de estabelecer-se sem um centavo do dono, ele desempenha o papel de esponja, em relação à fortuna de quem a adquiriu com o próprio suor ou a do que a acumulou graças a outras formas de enriquecer. Nada mais paradoxal que o dono do dinheiro entrega-lo ao banqueiro e, precisando de parte da fortuna depositada, recorra ao seu (sempre infiel) depositário, a juros em geral extorsivos. Algo como exigir o locatário que o locador pague o valor do aluguel contratado. Confesso não saber que nome Karl Marx deu a essa absurda forma de exploração. Nunca o filósofo alemão chamaria isso de mais-valia. Afinal, o trabalho - e só ele - é capaz de criar capital. Esse, um fenômeno tão antigo quanto a necessidade de alterar a natureza. As primeiras ferramentas, criadas e usadas ainda nos tempos mais recuados, puseram nas mãos do hominídeo utensílios de pedra, com os quais eram confeccionados outros bens. Ainda que supostos especialistas desconsiderem o fato, ali estava o que os modernosos chamam tecnologia. Toscas, sim, mas nem por isso distantes das funções dessas ferramentas. No percurso entre as ferramentas de pedra e os robôs, viu-se a construção de uma sociedade crescentemente egoísta. Mais que isso, ambiciosa e ilimitada em seu desejo de modificar a natureza, de preferência em favor de propósitos cada dia mais distantes dos que deveriam servir à coletividade. As grandes navegações, a intensificação do comércio, a agressão a povos e seus habitats, em todos os continentes, levou à formulação do que se chama capital. Até aqui chegamos, a despeito dos riscos enfrentados e superados, para permanecer agredidos, eliminados, excluídos, tudo em função da voracidade e prepotência do capital. Sendo que, agora, não se trata mais da pedra polida, e de tudo quanto a pedra pode produzir. O capital, hoje, traduz-se e se revela sob as mais diversas formas. Antes considerado suficientemente representado por alguns bens materiais, depois passou a ter no dinheiro seu símbolo mais representativo. A queda do padrão-ouro, depois, levou a novas alterações no conceito. Este, atualizado, mostra não ser o dinheiro, o dólar em especial, mais que papel pintado. Não há mais o lastro-ouro que conferia valor à nota de dólares. Fala-se do conhecimento, frequentemente (tanto quanto hipocritamente) apontado como o verdadeiro capital moderno. Enquanto isso, os capitalistas são os que mais se empenham em impedir que o conhecimento fique ao alcance de todos. Essas reflexões me chegam, quando se noticia novo golpe frustrado. Desta vez, mais uma prova de que se Deus escreve certo por linhas tortas, a obra-prima do diabo não tem como esconder o mal de que é portadora.

 
 
 

Acumulam-se informações sobre a chacina promovida pelo governo do Rio de Janeiro, no complexo de favelas Penha-Alemão. Sei, agora, que o adolescente morto, desde os 14 anos participava do Comando Vermelho. Sua aproximação com essa organização criminosa começou quando ele entregava alimentação, todo dia, a membros do CV, na favela. Quando seu pai soube dessa aproximação, tentou trazê-lo de volta à vida familiar, afastando-o do crime. Já era tarde. O garoto foi morto cerca de um mês depois que o pai dele o encaminhara a pastores - dizem as notícias -, para deles ouvir pregação capaz de recupera-lo para a convivência social, sadia e digna. A descoberta de que seu filho exibiu foto em que portava uma arma pesada, nas ruas da favela, foi o grito de alerta provocador da ação do pai do jovem agora morto. Impossível desconsiderar alguns aspectos ligados a esse - apenas mais um - drama com o qual convive a população das favelas, no Rio de Janeiro e em todos os demais estados. Comecemos pelo aspecto que parece inofensivo, como a tolerância de grande parte da população ou até o aplauso explícito o autoriza. O porte e uso de armas não foi estimulado e facilitado, senão por imagens expostas publicamente, não por favelados ou os interessados - ocultos ou escancarados - no lucrativo negócio das drogas. Outro aspecto tem a ver com os valores que justificam uma tal Teologia da Prosperidade. Segundo o discurso e as raivosas proclamações de lideranças orientadas por essa estranha percepção religiosa, ser pobre (de bens materiais, não mais) é pecado indigno de um fiel. A riqueza (material, nunca será demais repetir), então, reduz a vida humana à busca de acumular dinheiro e bens, seja lá como for. Não excluo outras hipóteses para explicar a tragédia do jovem assassinado. Apenas sugiro que esses dois aspectos sejam levados em conta, se desejamos de fato e sinceramente, combater o tráfico de drogas e impedir que mais jovens sejam atraídos a esse tipo de vida sem dignidade.

 
 
 

Vozes e Ecos da COP30, que o ABRAS/UFF- Núcleo de Estudos de Administração e Pensamento Social Brasileiro e a FAPEAD- Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Extensão, vinculada à UEMA- Universidade do Estado do Maranhão, será lançado hoje, em São Luís-MA. Coordenada pelos professores Paulo Emílio Matos Martins e Gustavo Costa, a obra reúne textos de diversos estudiosos da Administração e do Pensamento Social. Ilmar Polary(UEMA), João de Jesus Paes Loureiro e Violeta Refkalefsky Loureiro (UFPA), Henrique Pereira (INPA) e o editor deste blog (UFAM) têm textos de sua autoria incluídos no livro. Grande parte de Vozes e Ecos da COP30 corresponde às exposições feitas no XV Encontro Nacional de Administração e Pensamento Social Brasileiro, de 2025. Contando mais de 40 anos de trajetória, o ABRAS/UFF presta serviço à sociedade brasileira e latino-americana, eis que sua atuação se tem feito tanto no Brasil quanto em outros países da parte Sul e Central do continente. Este ano serão realizados o XV Encontro Nacional do ABRAS e o XI Encontro Latino-Americano de Administración y Pensamiento Social, do qual os professores, pesquisadores e estudiosos da América Latina participam, com destaque para a Universidade Andina Simón Bolivar, do Equador, integrada ao Núcleo há décadas. À crescente robotização das atividades antes reservadas aos seres humanos, vem ocorrendo há décadas a tentativa de anular o caráter eminentemente social das organizações, reduzindo a imagem das unidades produtivas a fenômeno capaz de ser esgotado em imagens gráficas, tabelas, cálculos e representações que deixam de lado aspectos peculiares ao ser humano. Em grande medida, essa visão de mundo, miseravelmente egoísta, não só vem provocando adoecimento no ambiente de trabalho, quanto ameaça a manutenção da vida humana no Planeta. O ABRAS, portanto, manda um recado para os negativistas de todo jaez: é possível fazer um mundo melhor, porque pensar não dói. Fazer sem pensamento apenas repete o que todo cachorro revela, ao atravessar avenida movimentada. Nem todos somos cães...

 
 
 
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