Ditaduras e tudo o mais que signifique degradação tem como base o desaparecimento. Seja de corpos sacrificados em longas, repetidas, sádicas e aprazíveis sessões de tortura, seja da memória dos que um dia se opuseram aos maus instintos dos agentes. Se a sociedade brasileira, os mais jovens sobretudo, agora tem a oportunidade de acompanhar o desaparecimento do engenheiro Rubens Paiva, também poderá saber algo de outra democrata feita vítima da ditadura empresarial-militar instaurada em 1 de abril de 1964. Refiro-me a Heleny Guariba, paulista nascida em Bebedouro, em 1941, formada em Teatro (USP), em 1964. E desaparecida (como tantos outros), em 1971. Oportuno e necessário livro organizado por José Armando Pereira da Silva conta essa história inconclusa, de resto, registro de fatos tornados rotineiros naquele vergonhoso período de nossa história. Nas 300 páginas da obra são relatados as torturas e o sofrimento a que foi submetida a jovem criada em ambiente religioso (seu pai era um pastor metodista), depois feita atriz e teatróloga, além de professora e diretora. Antes da decisão de responder ao autoritarismo na luta armada a que foram atraídos muitos jovens brasileiros de sua geração. Sucedem-se, nas páginas de Heleny Guariba - Destinos Sequestrados ( Com-Arte, São Paulo, 2024), depoimentos e documentos cuja leitura é indispensável, sobretudo para os que não puderam despedir-se de seus mortos - ou simplesmente desaparecidos para nunca mais. Alguns deles, submetidos à perversidade humana, mesmo quando merecedores da reverência e do respeito dos seus contemporâneos e pósteros. Na impossibilidade de continuar o processo de destruição de suas vidas e de seus sonhos, algum deles sofreu a agressão sempre partida de bocas pútridas, sob a forma de palavras - ou cuspe. É o caso do engenheiro e ex-deputado federal Rubens Paiva, como poderá ser, algum dia, o de Heleny. Por isso, a importância e a oportunidade colhida pelo organizador, que reúne depoimentos e documentos testemunhais da vida de um ser humano íntegro e generoso, dedicado e comprometido com a causa que é comum: tornar melhor a sociedade injusta e desigual em que vivemos. Se ainda não há, que venha logo o busto de Heleny, que o cuspe sujo, parta da boca imunda de que partir, jamais logrará conspurcar. Antes, renascerá das cinzas, até elas negadas aos que ficaram.
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