Ser e fazer-se humano
- Professor Seráfico
- há 1 dia
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Os que crescemos no pós-guerra temos testemunhado mudanças sociais, tecnológicas e econômicas tão abrangentes e profundas, que seria desperdício de tempo tentar compará-las às de outros períodos da História Universal. A tal ponto o Mundo se tornou diferente, que os estudiosos criaram o termo globalização, desde que Marshal Mac-Luhan sentenciou ter-se o Planeta transformado em uma aldeia global. Antes, dava-se atenção apenas aos avanços tecnológicos, que reduziram a distância entre países, seja pelas facilidades de deslocamento de uma a outra área do globo terrestre, seja pela possibilidade de aproximação instantânea pelos meios de comunicação. O fato é que cada dia que passa evidencia-se a necessidade de conceber solução para os problemas comuns, independente da longitude e da latitude dos lugares onde vivem os numerosos grupos humanos. O pensar global, agir localmente, como se vem dizendo – sem nem sempre o fazer – faz algumas poucas décadas. A atual crise climática parece dizer tudo, a respeito disso. Fortalece-se assim, pelo menos nos círculos em que o conhecimento supera a ignorância e a boa-fé não se rende à estupidez e à perversidade, a ideia de Tolstoi – saber do Mundo, a partir do que se sabe da própria aldeia. Talvez em nenhum momento da trajetória humana sobre as duas antigas patas traseiras, a sociedade terá tido oportunidade de refletir sobre o significado da vida de cada um e da de todos, abrigados sem exceção sob o mesmo teto e sobre a mesma superfície. É certo que a alguns só é dado perceber os aspectos materiais das mudanças operadas. Por isso, é pobre a perspectiva de que observam os problemas comuns apenas segundo essa óptica estreita e limitada. Quais os resultados e impactos das mudanças sobre os valores é o que de mais sábio poderiam indagar os interessados em mudar o Mundo. Já não tivesse esse propósito sido identificado por Cervantes, que o pôs na boca de sua mais marcante personagem – Dom Quixote de la Mancha. Passados mais de quatro séculos, permanecem os mesmos problemas e situações descritos pelo autor manchego, sem que grande parte – quem sabe a maioria – dos habitantes da Terra se dê conta de que a tecnologia, criação humana prestável à mais que a pura e simples sobrevivência material, sempre será utilizada segundo o valor que se empreste à própria condição de humanidade. Ninguém duvida, por exemplo, de que cada máquina ou robô que se crie e produza não se desvencilhará do interesse em substituir o homem. Por isso, cada movimento de qualquer máquina reproduz e reproduzirá algum movimento ou função das possíveis ao ser humano. Com as vantagens decorrentes das descobertas efetivadas pelos estudiosos das ciências, mesmo as que chamamos naturais. O que nos autoriza dizer serem todas as ciências – humanas: ou porque relacionadas aos valores, percepções e experiências de que o descendente do pitecanthropus erectus é portador exclusivo, ou porque sempre se haverão de relacionar à melhoria das condições e relações que o tornam efetivamente humanos. Origem e destino das ciências, portanto, são ambas ligadas ao ser humano. Como já se sabe e cada dia se vem sabendo mais, excluída a preocupação ética, chegaremos ao fim da humanidade, premiados ao inverso pela glória da tecnologia. Bombas mais potentes que as lançadas sobre Nagasaki e Hiroshima podem acontecer antes de eliminada a estupidez dita humana, só porque seus detentores têm conformação física semelhante à dos que realmente se fizeram e foram feitos humanos.
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