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Heróis dispensáveis, se há cidadania


Mostra-se cada dia mais necessário conter certo viés que vem marcando os mais altos magistrados do País. Está gradativamente afastando-se da realidade a máxima de que juízes só falam nos autos. As decisões judiciais acabam perdendo a força antes ostentada, com exposição dos magistrados a toda sorte de experiências nada lisonjeiras em sua vida profissional. Depois da trama criminosa conhecida como Lava-Jato, não têm faltado registros de malfeitos produzidos pelos membros do Poder Judiciário, em todos os graus e instâncias em que tal poder republicano é exercido. Agora, sensível a essa terrível realidade (quando o terror evangélico justifica o uso da toga judicial), o Presidente do Supremo Tribunal Federal identifica a necessidade de serem contidas com maior vigor e permanência as seduções a que estão sujeitos todos os cidadãos. Sobretudo, os que compõem a Casa na qual acabam por derramar-se as esperanças dos que têm lesados seus direitos, individuais ou coletivos. Antes, o desembraço e a sensação de poder com que certos ministros do Supremo encaravam câmeras de televisão e se pronunciavam a respeito de assuntos por eles mesmos ditos sub judice, anunciavam a quanto poderíamos chegar. Agora, parece agravar-se a deterioração desse estado de coisas, grave e ainda mais ameaçadora. Porque estejamos carentes de lideranças atentas às questões éticas que deveriam orientar a conduta de qualquer homem público – se não de todo e qualquer cidadão que mereça esta qualificação – vemos o cumprimento de um dever legal como presente de deuses que têm os pés no chão. À exação e sabedoria que deve estar em todos os atos de sua responsabilidade, esses enviados divinos passam a se crer autorizados a toda espécie de cometimento – para o bem e para o mal. Ao invés de juízes, grande parte da sociedade os tem como heróis. Dita pelo poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht, infeliz a nação que precisa de heróis. Ou seja, o conceito de cidadania e os direitos e deveres a ele associados, e que lhe dão fundamento, cede lugar à criação de pessoas excepcionais, apenas pelo desempenho correto do estrito dever legal. Neste caso, o respeito e a confiança acabam por ser alçados à condição mítica, com o que perdem a sociedade e seus mais altos sentimentos. É como se, correto no desempenho funcional ou profissional, ao bom servidor fosse outorgado poder maior do que o permitem a Lei Maior e toda a sequência legal que a acompanha. Uma forma de autorizar tudo quanto, mesmo afastado do dever legal e produtor de benefícios distantes dos que devem ser levados à sociedade, aprouvesse ao servidor que cumpre satisfatoriamente seus estritos deveres legais. Nesse sentido deve ser visto e apreciado (não apreçado) o esforço do Ministro Facchin, ao propor um código de conduta a ser obedecido pelos membros da cúpula do Poder Judiciário. Não custa insistir, mesmo quando raros são os ouvidos e olhos atraídos pela proposta, quanto poderíamos avançar, se a escolha dos membros do STF se fizesse segundo ritos que invalidassem a tentativa de todo Presidente de algum dos outros poderes – o Executivo e o Legislativo -, levar para dentro do mais alto tribunal os interesses e as pendengas de seu próprio interesse ou dos grupos por ele representados. Repito-me, sem rodeio: o artigo 3º da Constituição Federal, se bem interpretado e observado, impediria as frequentes crises institucionais, de que se valem os maus cidadãos, representados ou representantes.

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