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Flação ou flatulência

Só mesmo minha quase absoluta ignorância sobre a economia como ela vem sendo conceituada, cultivada e posta em prática pode explicar minha relativa perplexidade. Esta vem dos dilemas propostos pelos especialistas na área, derrubando uma das minhas mais fortes convicções: a de que, a certa altura da Vida, impossível ser tomado pela surpresa ou pela decepção. De tão cansados de ver tanta desgraça, os olhos parecem não conseguir ver a claridade das coisas. E dos dias. De tanto ouvir sandices, nunca se espera ouvir alguma capaz de ser mais louca que as captadas pelos ouvidos antes. É como se me fosse introduzindo no meio dos mercadores. Dia e noite. Era ainda adolescente, quando Juscelino deixava o governo com a inflação repudiada pelos que não gostavam do jeito quase brincalhão do mineiro que não via incompatibilidade entre a austeridade e a alegria de viver. Que não dispensava largos passos em um salão de festas, enquanto ia construindo um novo país. Com a inflação, ele deixou também Brasília, para o bem e para o mal. Sempre manipulada ao gosto dos que ganham, com ou sem inflação. Como se, privilegiados pelos deuses de um Olimpo inexistente, fossem fadados à riqueza - material apenas, como se tem visto. E ouvido. Um verdadeiro dragão da maldade, a inflação passou a constituir o cerne da ainda chamada Ciência Econômica. E incorporou ares olímpicos, a ponto de tornar-se a mãe de todas as verdades produzidas nos ambientes frequentados pelos especialistas. Das ventas desse dragão sopra a fome de grande parte da população mundial. Estimada em quase um bilhão de famintos. Cerca de 70 milhões deles, habitando os 8,5 milhões de km2 do mais espaçoso país da América do Sul. Lugar onde as taxas de juros oficiais batem recordes sucessivos, ganhando os céus, enquanto a cova é o destino de suas vítimas. É preciso evitar o aumento do consumo, esse vírus que infecta o organismo econômico das nações! A palavra de ordem, um libelo ao mesmo tempo que um brado de guerra, é o lema do combate à inflação. Ninguém se lembra de atuar na outra ponta. Pagar salários dignos, não apenas praticar intenso exercício de generosidade, caridade que mata a fome do dia. Que se dane o faminto, se amanhã a generosidade não é tanta! Afinal, a fotografia e o nome já estão nas colunas sociais e nas redes antisssociais, por que ir mais longe? Até o momento em que o país se desindustrializa, o desemprego mantém-se teimoso e produzir parece exemplo maior de sandice. Terá o deus mercado perdido o rumo? Nova ameaça paira sobre todos - os que se refestelam em orgias gastronômicas ou, não raro, simbolicamente antropofágicas, e os que frequentam em peregrinação diária, noturna, as lixeiras das cidades e seus arredores. É a deflação o nome do novo dragão, afeiçoado mais à hiena. Sorridente, à vista do espetáculo que mais agrada a esse mamífero. Nem tudo, para ele, porém, é teta...Nem tudo é ventosidade só...



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