O ambiente carnavalesco não consegue apagar a impressão de que o País prepara-se para testemunhar acontecimentos raros em nossa história republicana. Enquanto grande parte da população se entrega aos desregramentos momescos, outra parte continua a desempenhar seus papéis rotineiros, longe dos blocos e demais folguedos próprios ao período. Se na parte envolvida nos desfiles e festas, tudo é carnaval, canto e alegria, a outra experimenta sentimentos diferentes. Uma, preocupada com as consequências dos atos delituosos em que se envolveram os protagonistas. Uns, por absoluto desrespeito às pessoas e à democracia que torna mais civilizada a vida moderna. Outros, pela expectativa de ver levada a sério a promessa tantas vezes frustrada de consolidar e aprofundar as relações sociais de um verdadeiro Estado Democrático de Direito. Tantas e tão previsíveis e visíveis as provas dos delitos cometidos, que mesmo dentre os que de alguma forma participaram (planejadores, motivadores, lideranças, financiadores, divulgadores, apoiadores e executantes) do cometimento dos crimes, admitem estarmos às vésperas de um acontecimento raro - a prisão de um ex-Presidente da República. Não que outro nessa condição, tenha sido poupado de sofrer um constrangimento sabidamente ilegal. (Quem o disse foi a única instância autorizada a interpretar a lei, o STF). O que torna diferente a prisão de Lula do esperado recolhimento do ex-capitão líder do terrorismo de 8 de janeiro de 2023, depois dos atos preparatórios suficientemente conhecidos, é o cumprimento neste segundo caso, do devido processo legal. Ao contrário da coorte de ilegalidades e delinquências cometidas contra Lula, que o STF reconheceu, o que se tem visto em peças produzidas pelos próprios autores, resulta em extenso rol de crimes, desde aqueles de agressão direta à Constituição, ao descumprimento de normas regulamentares. Ilustrativos do que se afirma agora é a consumação de ofensas ao Estado Democrático de Direito e, em sucessivas e rotineiras oportunidades, desrespeito à legislação pertinente à saúde pública e ao meio ambiente. De entremeio, a apropriação de bens constituintes do patrimônio da república, o desvio de recursos públicos sob flagrante improbidade, além de outros desvios a que não faltou o registro de contrabando de joias. Enfim, um rol de assuntos e cometimentos que um bom curso de Direito deveria aproveitar como material curricular. Também como os desvios de ética parecem desimportantes para os autores bem postados na estrutura oficial do Estado. Por enquanto, já houve choro, chlilique, atribuição a terceiros subordinados dos atos investigados - e muito mais iniciativas feitas à margem e contra o ordenamento jurídico do País. Terminado o carnaval, para alguns, portanto, espera-se o dissabor de enfrentar as consequências dos seus maus atos. Os que participaram das festas presididas por Momo, I e Único, certamente estarão ainda em festa, talvez mais calorosa e promissora. Terão a consciência de que nasceram em um país que, não obstante a demora, reencontrou os caminhos que a alegria do povo e o potencial da natureza gostariam de ver aproveitados. Aí, então, caberá aos que investigam e julgam marcar sua presença. Podem fazê-lo, se não deixarem tudo terminar em pizza, mas em cinzas para uns e muita luz e paz para a maioria.
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