OS JOVENS TURCOS
- Professor Seráfico
- 23 de jul. de 2023
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Orlando SAMPAIO SILVA
No artigo que vem a seguir, reporto-me a um fato que teve lugar nos primeiros tempos da Primeira República, episódio que paira obscuro em nossa história.
É de lembrar-se a presença nos quartéis dos “jovens turcos”. Eles eram constituídos de tenentes brasileiros que estagiaram no exército imperial alemão, na Alemanha prussiana. Depois da reunificação da Alemanha, o Império Alemão atravessava um processo intenso de industrialização, progresso e modernização. Suas Forças Armadas, com identidade fortemente prussiana, encontravam-se em uma fase de fortalecimento e modernização. Foi então que, o Imperador alemão Guilherme II, interessado na ampliação da influência econômica e militar de seu país, ofereceu ao governo republicano brasileiro, recém constituído, a possibilidade de jovens oficiais do Exército Brasileiro poderem fazer estágios de treinamento junto ao Exército Alemão, na Alemanha. Foi, então, que, com o apoio do Barão do Rio Branco, Ministro das Relações Exteriores do governo brasileiro, o presidente Rodrigues Alves enviou, em 1905, o primeiro grupo de tenentes ao estágio na Alemanha. Em 1908, no governo de Affonso Penna, seguiu para a Alemanha, com o mesmo objetivo, o segundo grupo de jovens oficiais. Em 1910, no governo de Nilo Peçanha, com o incentivo de Rio Branco, ainda Ministro das Relações Exteriores, e com a adesão entusiasta do Marechal Hermes da Fonseca, Ministro da Guerra, partiu para o estágio na Alemanha o terceiro e último grupo de oficiais subalternos brasileiros.
Entre os jovens oficiais brasileiros que foram estagiar na Alemanha, encontravam-se: Estevão Leitão de Carvalho, Mário Clementino de Carvalho, Bertoldo Klinger (que veio a atuar fortemente na Revolução Constitucionalista de 1932, em São Paulo), Joaquim de Souza Reis Neto, Epaminondas de Lima e Silva, César Augusto Parga Rodrigues, Euclides de Oliveira Figueiredo (pai do general João Batista Figueiredo, que foi Presidente da República, no regime militar), Amaro Azambuja Vila Nova, Francisco Jorge Pinheiro, Constâncio Deschamps Cavalcanti, Manuel Bougard de Castro e Silva, Augusto de Lima Mendes e Evaristo Marques da Silva. Os três primeiros oficiais constantes desta relação, após seu retorno ao Brasil, lançaram a revista “A Defesa Nacional”, por intermédio da qual os militares divulgavam suas ideias e propostas. Alguns desses oficiais fizeram parte das primeiras turmas da Escola de Estado-Maior recém-criada.
O próprio Marechal Hermes da Fonseca, ministro da guerra (também no governo de Affonso Penna) e já eleito Presidente da República (ainda não empossado), a convite do Imperador alemão, esteve, então, em visita ao país europeu (1910).
Esses oficiais foram, de início, apelidados de “jovens turcos” por alguns militares e civis, inclusive pela imprensa, que se opunham a eles, ao seu pensamento, à sua postura em face da instituição militar e do poder civil. A razão de ser desse apodo foi o fato de que, antes dos brasileiros, jovens oficiais turcos tinham estagiado no exército alemão e que, ao retornarem ao seu país, atuaram politicamente, objetivando a modernização do estado turco e de seu exército, e se tornaram conhecidos internacionalmente como os “jovens turcos”. Este grupo de jovens oficiais turcos, por sua vez, foi herdeiro em ideais e ações políticas de outro grupo, do (então) passado recente da Turquia, os “jovens otomanos”.
Com o passar do tempo, esse apodo - “jovens turcos” - passou a ser admitido normalmente pelo grupo de oficiais brasileiros e pela corporação militar, e, assim denominados grupalmente, eles ingressaram na história militar de nosso país.
Os “jovens turcos” brasileiros postulavam a modernização e o progresso do Brasil, a modernização do Exército, bem armado e com as tropas bem treinadas, estavam centrados no projeto da segurança nacional, cultuavam o rigor da hierarquia e da disciplina, eram críticos dos rumos administrativos e políticos adotados pelos governos civis da República e combatiam rigorosamente a corrupção. Eles não postulavam a conquista do poder civil individualmente, porém, consideravam que o Exército poderia fazê-lo.
Os “jovens turcos”, apesar dos seus atos e ideais, e de sua forte presença no cenário militar do país, não se organizaram em um grupo de cunho revolucionário, como o fizeram os “tenentistas” de 1922 e de 1924. Os jovens oficiais, que constituíram os movimentos “tenentistas”, participavam de ideais semelhantes aos dos “jovens turcos” brasileiros. Em acréscimo, eles se posicionavam radicalmente contra os governos civis constantes de oligarcas, políticos ditos profissionais à frente do Poder Executivo; eles eram revolucionários e postulavam a conquista pelos militares do Poder pelas armas. Seus ideais se fundamentavam, teoricamente, no pensamento positivista.
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