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O enxerimento: a “Velha Jaqueira” pode ter uma diretora

José Ribamar Bessa Freire


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- Menino, deixa de ser enxerido!!!

-  Sou enxerido, porque sou querido.                                  

Era assim que na Manaus da minha infância, nos anos 1950, respondíamos cheio de empáfia, quando alguém reclamava que a gente metia o bedelho onde não era chamado.

Ninguém me chamou, mas enxerido que sou, decidi dar um pitaco sobre a eleição para dirigente da Faculdade de Direito (FD) da Universidade do Amazonas, no próximo dia 6 de novembro. Atentem bem para a escolha do termo “dirigente” e não “diretor” como é o costume. Isso porque em seus 116 anos a “Velha Jaqueira” pode eleger pela primeira vez uma diretora: Dorinethe dos Santos Bentes Rolim e seu vice Ananias Ribeiro de Oliveira Jr. Isso será um feito histórico, seguindo tendência de outras universidades brasileiras.

São vários os motivos para tanto enxerimento:

1.A Faculdade de Direito, filha dileta da Universidade Livre de Manáos, forma profissionais, que devem ser eticamente decentes, tecnicamente competentes e comprometidos politicamente com o Amazonas e seu povo. Sua gestão interessa não apenas a alunos, docentes e funcionários, mas ao conjunto da sociedade, que se beneficiará ou sofrerá com as consequências da escolha. Dorinethe é garantia de que a “velha jaqueira” será bem tratada e terá alguns galhos podados para manter a produtividade de 200 frutos por ano.  

2. Embora geograficamente distante, luto por aquilo que acho melhor para Manaus, onde nasci e para a Universidade Federal do Amazonas, onde fui docente por alguns anos. Faço uma paródia dos versos do poeta Félix Athayde sobre Olinda, sua cidade natal. “Quando eu quero a UFAM, não é lá que vou, busco-a em mim mesmo, onde UFAM eu sou”.

Direito Indígena

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3. Conheço bem a candidata à diretora, com quem convivi.  Compartilhamos a sala de aula, ministrando cursos de História na Licenciatura Cultural Indígena para professores Tikuna e Kokama do Alto Solimões em 2008 e 2009. Em 2010, no Curso de Pedagogia da UEA, a experiência se estendeu em videoaulas dadas da Plataforma da Secretaria de Educação localizada no bairro do Japiim para 2.615 alunos, dos quais 745 indígenas, distribuídos em salas equipadas com hardwares em 52 municípios do Amazonas.

4.  Sou desorganizado e meio anárquico. Por isso, fiquei bem impressionado com a capacidade de organização da Dorinethe, que concebeu a ementa da disciplina, preparou material didático e coordenou a publicação de vários livros do Curso de Licenciatura Cultural, um dos quais sou coautor: História Geral da Educação: A Questão Nacional e da América Indígena.

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5. Na época, ela havia acabado de se formar em Direito. Eu, que só cursei até o 3º ano na Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, muito aprendi com ela sobre Direito Indígena. Papo vai, papo vem, graças a essas conversas, me habilitei para dar um módulo sobre Direitos Indígenas no Curso de Extensão de Direito Social da UERJ, além de atuar em vários cursos da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro (EMERJ), para juízes vitaliciandos em período probatório.

6. Dorinethe entende do riscado, sempre preocupada com a realidade amazônica, tanto no campo da História como no do Direito.  Mestre em História, concluiu seu doutorado em direito na UFMG, com a tese publicada em livro sobre a Justiça do Trabalho e “um olhar sobre a aplicação do jus postulandi no contexto amazonense. Coordenou o curso de graduação da FD e está vinculada ao grupo de pesquisa Direito de Proteção dos Vulneráveis e Sistema de Justiça, o que diz muito sobre ela e sua opção preferencial pelos lascados.

Sem perder a ternura

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A provável nova diretora da FD tem muitas publicações relacionadas com a nossa realidade regional como o livro com outros autores e artigos sobre: o Direito Transnacional e sustentabilidade na Amazônia, o direito fundamental de acesso à Justiça e a gratuidade, a modernização das relações trabalhistas, a precarização dos Direitos Sociais na era digital e tantos outros. Caso o STF julgasse algum trelelê sobre a Amazonia, o ministro Luiz Fux, para não falar besteira, teria de ver a produção da Dorinethe e levaria três dias lendo seu voto.  

Tive a honra de escrever a apresentação do livro sobre as outras faces de Manaus, na qual afirmo que o rio Madeira já deu muita gente boa para o Amazonas, suas águas trouxeram a autora de Borba, onde nasceu, para Manaus. Gente boa por sua forma de tratar alunos, funcionários e colegas, sempre firme, “pero sin perder la ternura jamás”, na perspectiva já analisada por Marilena Chauí, que define três tipos de docentes:

- Existe o professor autoritário (aqui pra nós meio babaquinha), que acha que sabe tudo, incapaz de ouvir seus alunos e de com eles dialogar. O segundo tipo é o professor populista (aqui pra nós, meio simplório) que renuncia seu papel de condutor do processo pedagógico. Delega de forma demagógica aos alunos a tarefa de decidirem sobre o programa e até sobre a nota que lhes será atribuída. O terceiro, a quem a Tereza deu a mão, é quem como a semente de trigo do Evangelho, morre para que o aluno floresça.

Um filho sempre será um filho. Mas o sucesso de um professor é quando um(a) aluno (a) deixa de sê-lo para se tornar seu par. E esse é o sentido da “morte”. Dorinethe já “morreu” muitas vezes.

No curso de História da Amazônia para 220 Tikuna e Kokama, havia quatro turmas, cada uma com um professor, com uma particularidade inusitada: cada docente tinha sido aluno do outro. Se funcionasse a paternidade, Geraldo Sá Peixoto Pinheiro, meu ex-aluno, seria um filho. Dorinethe, sua filha e minha neta e o Davi Avelino Leal, filho da Dorinethe e meu bisneto. Brincávamos que os Tikuna e os Kokama eram meus tataranetos. Com todos eles, muito aprendi.

Dorinethe: de Leste a Oeste   

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José Seráfico é o mais amazonense de todos os paraenses, a tal ponto que acha o Teatro Amazonas mais bonito do que o Teatro da Paz. Ele saiu do bairro do Umarizal, em Belém, para Manaus. Quando era aluno do Colégio Estadual Paes de Carvalho, certamente conheceu o jingle do Marechal Lott, candidato a presidente da República em 1960:

- De Leste a Oeste / De Sul a Norte / A terra brasileira / elegerá o marechal Teixeira Lott.

Ex-diretor da FD (1985-1987), José Seráfico apoia a candidatura de Dorinethe, que é uma boa rima e uma solução, o que facilita parodiar o jingle do Lott:

- De Norte ao Sul / De Leste a Oeste / A Velha Jaqueira / Elegerá diretora a Dorinethe.

P.S 1 – Além do Seráfico, existem outros apoios de peso, aqui vai uma lista com alguns nomes somente de professoras de leste a oeste, do sul ao norte:

Faculdade de Direito da UFAM: Professoras Francy Litaiff Abrahim; Francisca Rita Alencar Albuquerque; Marina das Graças de Paula Araújo e professor Érico Xavier Desterro e Silva.

Universidade Federal do Pará: Patrícia Kristiana Blagitz Cichovski, professora do Instituto de Ciências Jurídicas na Graduação e no Mestrado em Direito e Desenvolvimento da Amazônia (PPGDDA).Coordenadora de Egressos do Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA. Mestra e Doutora em Direito;  José Heder Benatti, professor titular do Curso de Direito da UFPA. Mestre em Direito e Doutor em ciência e desenvolvimento socioambiental pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos.

Centro Universitário do Estado do Pará (CESUPA): Juliana Rodrigues Freitas, advogada, doutora e mestra em Direito (UFPA), advogada e professora desde 2003 da Graduação e Mestrado em Direito do CESUPA.

Universidade Federal do Amapá - Linara Oeiras Assunção,Mestre em Direito Ambiental e doutora em Direito e Justiça (UFMG), professora de Mestrado e Doutorado (INIFAP).

Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná: Melina Fachin, Diretora da Faculdade de Direito da UFPR 

Universidade Federal de Alagoas: Elaine Pimentel, diretora da Faculdade de Direito da UFAL.

Universidade Federal da Paraíba:  Anne Augusta, diretora da Faculdade de Direito da UFPB. 

Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) Luciana Gaspar Melquiades – diretora da Faculdade de Direito da UFJF.

Universidade Federal do Piauí: Cristiane Matos – chefe de departamento da Faculdade de Direito da UFPI.

P.S 2 –Bem que avisei logo no início que eu era enxerido.

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1 comentário


jdutrajr
há 2 dias

É uma satisfação enorme poder acompanhar esse momento de bem-estar e confiança e porque não de renovação? Fico ainda mais feliz em ver que essa renovação de energia e autoestima a motivou a buscar novos desafios, como concorrer à direção da Faculdade de Direito. Desejo muito sucesso nessa caminhada e que continue inspirando com sua determinação e força.

Com carinho, João Catarino Jr

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