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Holocausto versão 2


 

Mustafa Barghouti, membro de uma organização democrática palestina, mostrou o verdadeiro conteúdo do conflito imposto desde semana passada pelo governo de direita de Netanyahu. Talvez o mais esclarecedor de todos os depoimentos que tenho lido ou ouvido, a respeito da guerra entre palestinos e Israel. Barghouti compara o apartheid determinado pela ação do governo israelense nos territórios tomados dos palestinos, já no ano de 1967, ao seu antecedente, experimentado na África do Sul. Em suas palavras encontram-se, além disso, razões de sobra para comparar o que os governantes do povo vitimado pelo primeiro holocausto estão fazendo contra os habitantes de Gaza, Cisjordânia, parte de Jerusalém e Golan. Deixando marcado na História o segundo holocausto. Aos brasileiros cabe lembrar que não era isso que Oswaldo Aranha desejaria ver, depois de todo o esforço feito para assegurar aos israelenses a porção territorial que lhes concedeu a oportunidade de ter uma vida digna e produtiva. Também há de ser comparada à resistência (não à ofensiva, à moda terrorista) palestina a um acontecimento que, entre nós, serviu apenas para a prática do assassínio de inúmeros grupos de resistentes à ditadura, a que os mandões de então chamaram Guerrilha do Araguaia. Lá, como aqui, faleceu qualquer, mínima que fosse, oportunidade de resolver as contradições políticas como elas devem ser superadas – com o diálogo, a apresentação de teses e propostas que assegurem a paz, primeiro dos grupos envolvidos, depois, de toda a população das áreas ocupadas ou em conflito. Daí a inevitável referência aos valores partilhados pelos autoritários daqui e a direita representada por Benjamin Netanyahu. Acima de qualquer outra coisa, é descartada a menor probabilidade de viver em paz e deixar viverem em paz os povos que não comungam dos mesmos valores e preconceitos. Esse tem sido, entretanto, o fermento que faz explodir, ora aqui, ora acolá, algum desses conflitos adredemente planejados, não se sabe ainda com meridiana clareza em que gabinetes do mal. É conhecida a expressão de São Tomás de Aquino, a ira bona. O direito de os humilhados e oprimidos revoltarem-se contra os opressores, baldados todos os esforços que levariam a negociações dignas de seres humanos. A vida dos oprimidos, reduzidos a escória material e lhes sendo imposta a humilhação – quando não o extermínio - levaria ao risco de perdê-la, se frustrado o seu direito de protestar e reivindicar tratamento menos indigno. É bem disso que se tratou no Brasil da década dos 1970, quanto o é o que experimentam os palestinos, desde 1967. É inescapável a comparação do novo Hitler com seu modelo, que muitos, por ingenuidade ou não, pensam ter sido vencido na Segunda Grande Guerra. Se no campo de batalha foi encontrada a fórmula para dividir o território do Planeta como o butim desejado, no terreno das ideias estamos longe de experimentar igual resultado. Israel apoderou-se de territórios tradicionalmente ocupados pelos palestinos, e todas as manifestações do Conselho de Segurança da ONU só se prestaram a revelar a fragilidade do órgão internacional. Por isso, Cada uma delas não conseguia obter mais que o desprezo e a inobservância dos governos israelenses. Estes sempre deram de ombros para as decisões do Conselho, sob o olhar e o quase reverente apoio de outras nações que se dizem democráticas. Baghouti não esqueceu sequer de mencionar que o governo norte-americano nunca faltou com sua adesão às teses de Israel. Pode-se discordar e alimentar justo asco pela guerra. Tanto quanto pelo terrorismo, ainda mais se praticado pelo Estado. Não se pode, todavia, negar a pretensão de os palestinos encontrarem seu Oswaldo Aranha, sobretudo pela teia de relações que tentam caracterizar o direito de legítima defesa de um povo dominado, como ação terrorista. Nem é preciso lembrar que o fundador de Israel moderno, Ben-Gurion foi – ele, sim – um guerrilheiro. Entre morrer porque esta é a vontade e o projeto do inimigo, e arriscar uma oportunidade de sobreviver, os palestinos já fizeram a opção. Nem todos os cidadãos israelenses apoiam as ações de Netanyahu. Por isso, os divergentes são logo acoimados de antissemitismo. De palavras e rótulos vive a direita, onde quer que se lhe dê a oportunidade de expor a podridão que frequenta a maioria das cabeças de seus representantes. Estamos diante de um segundo holocausto e só uns poucos se dão conta disso.

 

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