Pouco a pouco, a sociedade brasileira vai construindo um futuro muito mais parecido com os tempos remotos. Não faltam sinais de retrocesso, como se a maioria se tenha dado conta de que não valeu a pena chegar aonde chegamos. Ao mesmo tempo em que saudamos as mais recentes inovações tecnológicas, furtamo-nos a assumir as responsabilidades que esses avanços deveriam impor a cada um e a todos nós. As vantagens da comunicação mais rápida e do encolhimento do Planeta, que coloca a toda hora em contato direto pessoas distantes entre si por milhares de quilômetros, ignora qualquer restrição à satisfação de nossos piores instintos e apetites. Festeja-se mais a morte que a Vida, tomando as significativas conquistas científicas e tecnológicas em proveito da primeira, não da outra. Multiplicamos, assim, as desigualdades e eliminamos aqueles dos quais discordamos. As chamadas redes (anti)sociais inserem-se nesse quadro como potente e até agora insuperável e incontrolável instrumento de falsificação. Prestando-se à disseminação de mentiras geralmente produzidas por cérebros adoecidos, as redes contribuem para a intranquilidades coletiva e a animosidade entre – perdoem-me a expressão – hordas distintas e inimigas. A sociabilidade se faz às avessas. Como Hobbes previra, o homem mostra-se o lobo do seu semelhante. O mal é praticado sob a mesma inspiração e o mesmo aplauso dos cometimentos beneméritos. A realização plena e indiscutível do que Hannah Arendt chamou a banalização da violência. De roldão, vão sendo atropelados conceitos amadurecidos por longo período histórico e de alguma forma vinculados à ideia de civilização. Esta, por conseguinte, perdeu seu sentido original, não se sabendo mais o que a distingue da barbárie. Parece faltar à maioria da sociedade humana qualquer sentimento ético, daí a prevalência de métodos e processos agressivos aos mais reconhecidos direitos humanos. Desde que a Vida deixou de ser direito atribuído a todos os seres ditos humanos, parece normal atentar contra ela, quando se refere ao outro. Esse sentimento de alteridade, portanto, vai-se esgarçando, como traço marcante dos tempos que vivemos. Tempos de catástrofe¸ para alguns, paradoxais, para outros, a verdade traduz certo distanciamento do que pensávamos ser progresso, civilização. A tal ponto chegamos, que o conceito de humanidade pouco a pouco vai perdendo o sentido e deixando entrever um regresso aos tempos de pura selvageria. Ainda agora, a reação de uma terapeuta que assistia a um homicida a quem são atribuídos cem assassinatos, detonou uma onda de respostas insertas nas redes. Nelas, a indicação de estar próximo o dia em que a pena de morte será implantada na legislação brasileira. Incapazes de fazermos da apenação dos condenados a oportunidade de ressocialização, restará voltar ao talião. Não se vê qualquer esforço, pelo menos dos ditos representantes populares e dos governantes, para corrigir os desvios registrados no sistema penitenciário. Correções objetivando fazer da pena instrumento de recuperação do condenado, não do agravamento dos males com os quais já convive. Na maioria dos casos, tornando-se causas do(s) crime(s) praticado(s). Longe de mostrar sadia preocupação os construtores da repetição do passado (o retrocesso) suprem suas próprias carências – intelectuais, mentais, afetivas, materiais etc. – com práticas lesivas à sociedade e à pretensão de humanidade que muitos outros têm defendido.
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