Passei a ler mais jornais editados no Brasil. Algumas revistas também têm chegado à tela do meu computador. Tento entender a realidade que me cerca e obrigatoriamente me faz incluir no rol dos seus construtores - da realidade, não dos jornais e revistas nos quais busco informação. Aqui, encontro a preocupação de estudiosos revelando o desastre anunciado para os jovens entre 18 e 29 de idade. Os que escaparem ao morticínio que os tem tornado vítimas preferenciais. Quase 15% deles estão fora do mercado, sendo que alguns também não têm lugar nas escolas superiores do País. São os nem-nem. Adiante, outra notícia que me incomoda: aumenta a longevidade dos brasileiros, mas são muito poucos os idosos que conseguem ter uma qualidade de vida digna de sua contribuição de décadas, aos cofres públicos, à cultura, à convivência social que a condição humana cobrou deles. Leio nas folhas econômicas referências ao extraordinário desempenho dos bancos (para ficar apenas nesse, o mais ilustrativo dentre todos), a cujos lucros corresponde o enxugamento de seus quadros. Menos empregados, maiores os lucros - é a síntese disso. Ao lado, a informação de que a operação Desenrola espraia-se e busca atingir mais beneficiários. Porque o número de endividados tem aumentado. Leio sobre os exponenciais investimentos na segurança pública. Mais armas são compradas; mais viaturas transportam os policiais, a todos os lugares onde lhes aprouve ir. Não obstante, são desanimadores e trágicos os números relativos à perda de vidas humanas. Em, geral como outra notícia evidencia, nos mesmos lugares aonde foram os policiais bem armados e conduzidos em viaturas modernas e bem protegidas. Com a peculiaridade de que, inimigos das câmeras, sempre matam em confronto com os inimigos. Também leio sobre o aumento da produção e da exportação de sucessivos recordes de alimentos. Quase ouço os foguetes que festejam o agronegócio e suas exportações. Páginas à frente, a notícia de que a Amazônia não demora será uma savana, se muito. Mais poderia dizer, por escrito e aqui, mas não creio necessário. O que me interessa, ao mostrar as relações contraditórias que o noticiário revela, é dizer da dispensabilidade de fazer rodeios e buscar explicações apenas nos números. Estes, como se sabe, podem explicar tudo. Sempre, porém, segundo as preferências e apetites dos que os utilizam. As causas dessas contradições que o noticiário expõe como uma fratura exposta de fêmur, têm muito mais a ver com a vontade dos agentes, responsáveis mesmo quando movidos por criminosa irresponsabilidade, pela realidade de que somos parte. Daí meu absoluto desinteresse por saber quantos milhões foram gastos na aquisição de armas e transportes usados pelos sistemas de segurança pública. Muito menos quanto se pagou para incentivar tal ou qual empresário, que põe, quando muito, 10% de seu capital próprio em seu crescentemente lucrativo negócio. Importa-me saber, isto sim, quantos empregos foram oferecidos aos jovens; qual a qualidade de vida de que desfrutam os idosos; em quanto terá caído o número de ações policiais na periferia das cidades e em quanto se reduziu o número de mortos e sequelados pelas operações ditas de segurança (segurança de quem?); qual o mapa da fome no País, como resultado do êxito do agronegócio. Outras contradições e outros exemplos da forma inadequada de avaliar o desempenho dos governos poderiam ser citados. mas creio bastarem estes comentários para dizer do quanto não interessa aos donos do poder ir às causas dos problemas. Talvez lhes reste o que meu professor de Direito Penal chamava oásis de honra. É esse território, pequeníssimo quando existente, que os impede de assumir a responsabilidade que, infelizmente e ao final, sentimos ser de todos. Os que exploram, tanto quanto os que financiam as atividades dos exploradores; os que ganham mandatos eletivos, tanto quanto os que patrocinam suas candidaturas; os que lemos, ouvimos e escrevemos, tanto quanto os que nos leem e ouvem, sem que consigam enxergar ou escutar nada do dito ou escrito. Sem falar na realidade, transparente em cada esquina de nossas cidades. Qualquer o nome que se dê ao sistema que envolve tantas e tamanhas contradições, essa é a realidade que muitos não desejam mudar. Por isso que a Política, sendo atividade reservada aos seres ditos humanos, responde por tudo quanto a sociedade vai construindo. Para o bem e para o mal.
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A política, assim como as demais ações que indivíduos promovem em nome da coletividade, dependem de quem as promovem.
Tudo na vida depende de quem faz. Pastores desonestos falam em Cristo, políticos e agentes públicos corruptos agem em nome da sociedade, militares nazifascistas falam em democracia, professores fingem que educam, médicos juram por Hipócrates, advogados, promotores e juízes falam em direito e justiça e eu escrevo uma resposta que não será lida.