O episódio envolvendo a distribuição da dinheirama das emendas parlamentares não se esgota na percepção do que, por paradoxo, ficou mais ostensivo: o segredo. A ocultação dos atos administrativos, todos aprendemos com a experiência, é bem cultuado, defendido e arraigado nas ditaduras. Mesmo quando elas ainda não ultrapassaram a fase de gestação. Do ponto de vista mais amplo, e por isso, com tônus político maior que a preocupação ética, trazer à baila outras variáveis parece recomendável. Neste caso, vale a pena arriscar a incompreensão e a crítica de outros analistas. Quem sabe o embate desejável ocorrerá, transformando a análise original em detonador de processo tão necessário quanto essencial à convivência democrática. Na essência, a existência das emendas parlamentares resulta em grande medida da inexistência de um projeto de nação. Tivéssemo-lo, os recursos orçamentários seriam vinculados e se destinariam, única e exclusivamente, às funções, aos setores, às regiões, aos Estados e Municípios, segundo as prioridades estabelecidas. Seria esse, portanto, o critério de distribuição dos recursos públicos. Vantagem inicial seria dispensar os parlamentares federais da conduta atual, compreensível no âmbito municipal, mas um despróposito quanto à União. Os que se têm pejorativamente chamado de vereadores federais perderiam a razão de ser. Ninguém espere que isso agradaria a todos, mas não seria surpreendente a adesão de bom número deles. Pelo menos, daqueles que veem necessária a escolha de um projeto de nação, com todas as suas consequências e os problemas daí resultantes. Do ponto de vista da sociedade, ela teria mais a ganhar que perder. Primeiro, porque um projeto de nação em todo caso é diferente de um projeto de governo. Pelos objetivos, pelo prazo, pelos compromissos de todas as partes. Depois, as relações interinstitucionais tenderiam a tornar-se mais fortes e solidárias, dando a sensação de estabilidade a todos os agentes. Mais fácil seria manter a autonomia dos poderes e a harmonia necessária, se todos eles se voltassem ao cumprimento da determinação do artigo 3º da Constituição Federal. Não é desprezível a contribuição que a proposta aqui contida poderia dar ao combate à corrupção. Os constrangimentos orçamentários desmontariam os privilégios de que são detentores uns poucos parlamentares que, em contrapartida, veriam reduzida a pressão dos seus eleitores para liberar verbas sem nenhum vínculo com um projeto nacional. Não descarto a possibilidade de alternativas a esta proposta, nem da boa qualidade de qualquer delas. Ê preciso, todavia, conhecê-las e discuti-las.
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