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Fundo raso

Sob o título Problema de fundo, editorial da Folha de São Paulo (11-04) protesta contra a enormidade dos recursos públicos que financiarão partidos políticos e candidatos, nas eleições de outubro deste ano. No que toca esse absurdo cometido pelos interessados em ter a dinheirama posta sob suas mãos e apetites, não há como discordar. Com posição igual à do órgão de comunicação, nesse particular, creio todavia tratar-se de análise rasa, distante do que penso razoável admitir e defender. Se é que os interesses coletivos e os problemas sociais têm algum peso na análise e nos comentários por ela provocados. A ampliação dos recursos, qualquer que seja o ângulo do qual se a aprecie, constitui mais que um equívoco. De equívoco nada há a dizer, tão distante ele está da realidade dos fatos, por mais que se deseje ignorar ou ocultar suas nojentas motivações. A experiência revela as más intenções, ao mesmo tempo em que leva à justa suspeita de que pior ainda poderá acontecer. O que se pode ponderar na opinião da FSP prende-se ao que as linhas não dizem com todas as letras, mas ao observador atento não escapa. De minha parte, vejo a defesa sorrateira (solerte, também) da participação do dinheiro privado, com todas as consequências sabidas e ressabidas que isso tem trazido ao resultado das urnas. Ou seja, empréstimo feito por pessoas físicas ou empresas, que acabam por tornar-se proprietárias de mandatos exercidos por terceiros, exatamente os que podem retirar parte da riqueza acumulada para facilitar sua monstruosa e fabulosa multiplicação. O velho patrimonialismo de capitanias hereditárias de que têm tratado tantos comentaristas. A História do Brasil não pode ser bem escrita, se escapar aos estudiosos e analistas o que esconde a injeção de polpudas somas nas campanhas, inclusive mais que aos partidos. Daí minha convicção de que - como contraditoriamente afirma o editorial da Folha -, compromete-se a rotatividade do poder, sobretudo em função dos critérios que presidem a distribuição da fortuna dos cofres públicos e financiam as atividades políticas. Estas, as mais importantes ao Homem, tal como o conceituava Aristóteles - o homem é, em essência, um ser político. A democracia não pode ser negociada no balcão, e tem seu exercício (sobretudo por isso) correspondente à vontade dos cidadãos. Deve, portanto, contar com recursos suficientes para o custeio das atividades que lhe são próprias. Se os partidos majoritários dispõem de maior volume de recursos, maior a probabilidade de manterem-se no poder, o que corrompe o próprio princípio da rotatividade do poder, como se manifesta o jornal. A não ser que admitamos a força das armas e a força do dinheiro como as duas maiores forças da democracia, entendo-as ambas voltadas à constituição e manutenção de governos autoritários. Neste caso, apenas os instrumentos se revelam diferentes. O propósito é o mesmo, como Wladimir Putin e Joe Biden nos revelam, à custa de ainda não sabemos ao certo quantos mortos. Se permanecer raso o nível de compreensão dessas questões, nada se poderá esperar, inclusive da suposta democracia que todos dizem amar, ao mesmo tempo em que concorrem para que ela feneça, onde quer que venha sendo tentados sua instalação ou aperfeiçoamento. A constatação de um só centavo privado a alavancar partidos e eleições, a meu ver, seria crime punível com a quarentena do delinquente (pessoa física ou empresa), não afastado do convívio social, mas posto à margem do processo político e tudo o que dele decorre. Já tenho dito isso em outros textos, razão para desta vez não o repetir. Neste mesmo blog (COMISSARIA) tratei do tema.

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