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Foto do escritorProfessor Seráfico

Dignidade

O culto à tortura tem sido uma das marcas do Presidente da República. Há quem veja na reiteração da perversão tornada conhecida quanto ele era deputado, simples estratégia. Suas declarações serviriam para esconder ou levar ao esquecimento os atos ilícitos praticados pelos seus zeros-à-esquerda, que se espera logo, logo, a Polícia e a Justiça ponham cobro. Assusta-me, mais que tudo, a tolerância - quem sabe até o apoio - dos ex-colegas de caserna que o cercam na Presidência. Porque tenha conhecido oficial de dignidade exemplar e por considerar absurda a hipótese de que o Chefe do Poder Executivo não é a regra, mas a exceção, conto história que justifica meu conceito. Tanto quanto minha repulsa indignada. Falo de um ex-ajudante-de-ordens do General Comandante do Comando Militar da Amazônia, que tive como aluno no Curso de Administração da Universidade do Amazonas. Em meio à aula, um aluno perguntou-me sobre a tortura: o que eu achava dela e de sua eventual legitimidade. O aluno militar, polidamente, manifestou seu ponto de vista. Invocou sua condição de combatente das forças armadas, na Guerrilha do Araguaia, mostrando contrariedade com minha posição, radicalmente avessa à tortura. Ponderei: no campo de batalha, os dois lados sabem dos riscos que correm. A morte do outro, portanto, é meta de ambos os lados em confronto. Não é assim a situação de um preso posto sob a custódia do Estado. Até nas guerras entre nações há regras. Ilustrei, aproveitando o fato de que estávamos no segundo andar do prédio. Qual a reação justa, se algum aluno descesse e, ao pé da escada, encontrasse um desafeto, sentado em uma cadeira de rodas, aproveitando-se disso para espancar o paraplégico? Essa, sim, seria situação assemelhada à do torturador diante do torturado, esta mais grave ainda por envolver responsabilidade do Estado. O ajudante-de-ordens do CMA ouviu atento e a discussão teve fim. Na aula posterior, o major chamou-me a um canto e disse estar convencido de que a razão estava comigo. Considerou a tortura, como eu, uma covardia, um ato monstruoso. A partir daí, tratou-me como um amigo que o tinha feito ver a luz. Encontramo-nos várias vezes nos mais diversos lugares da cidade. Quando acompanhado de membros da família, sempre me chamava, para apresentar-me aos seus familiares. Édson Nascimento era o nome daquele homem, digno como não são muitos de seus colegas. Sua dignidade deixou marcado um lugar na minha memória e no meu coração.

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