Os fatos políticos se vão esclarecendo, na mesma medida em que as previsões se tornam mais fáceis. A claridade posta sobre acontecimentos que convém a um lado e outro esconder acaba por abrir a mente dos incrédulos e aguçar a percepção dos outros. Assim, mesmo desinformados e ingênuos não têm mais como pretextar vãs razões para fazer do seu voto o exercício do suicídio como nação e, no limite, também como indivíduos. Aumenta, assim, a multidão de arrependidos, acompanhados pelos mais fundamentados motivos, mas também pelas mais pueris razões. Importa pouco isso, dado que sempre haverá a oportunidade de refazer conceitos, desviar precipitados julgamentos e superar as duas coisas tão bem exploradas pelas partes em confronto. Isso faz bem, tanto aos arrependidos, quanto à sociedade. É justo esperar, portanto, que o conceito do Poder Judiciário vá aos poucos se recompondo, porque a contumácia com que agem certos agentes criminosos fica exposta. Refiro-me, especialmente, à volta à Penitenciária do ex-deputado Roberto Jefferson, que levou à prática, a seu modo, a tentativa de intimidar agentes da Polícia Federal, no exato cumprimento de seu dever legal. Todos eles estavam ali, munidos de mandado judicial, para fazer cumprir determinação do ministro Alexandre Moraes, autoridade competente para expedi-lo. Não para levar pela primeira vez o já condenado indivíduo para a cadeia, mas porque as condições que o levaram à prisão domiciliar foram simplesmente descumpridas pelo presidiário, preso em sua própria residência. (Aqui, talvez, uma inadequabilidade do instituto, pela diferença jurídica entre residência e domicílio). Voltemos, porém ao que interessa. Há quem veja na resistência armada de Jefferson ao grupo de agentes da PF ato vinculado à tentativa de auto-golpe de que há muito o Presidente e seu vice-Presidente vêm falando. Jefferson teria sido, assim, uma espécie de percursor, e usuário de palavras e meios que passaram a frequentar o ambiente político brasileiro, ainda que isso não seja coisa recente. Para quem tem memória, ainda estão vivos certos acontecimentos que, agora se pode enxergar
com maior clareza, têm a ver uns com os outros. Importa pouco ou nada a distância temporal entre eles. Convém alinha-los, mais para despertar nos interessados o desejo de descobrir os nexos e avaliar a gravidade do momento por que agora passamos. 1. a tentativa do então tenente em mandar pelos ares a usina de abastecimento de água da cidade do Rio de Janeiro; a ainda hoje não suficientemente explicada absolvição do envolvido no ato terrorista planejado, que o general Ernesto Geisel e outros colegas consideravam um mau militar; as frequentes declarações do atual Presidente, como parlamentar, confessando que o de melhor aprendido em sua vida teria sido o ato de matar; o lamento pelo golpe militar-empresarial de 1964 não ter matado pelo menos 30.000 pessoas, dentre as quais - a isso ele deu destaque - o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso; o culto às armas e a defesa intransigente, ainda que tosca e descabida, de conhecidos desordeiros, milicianos, matadores e outros de extenso e numeroso rol de delinquentes; a menção à guerra civil como uma aspiração pessoal; a facilitação do comércio, aquisição, porte e uso de armas de fogo, ainda mais cobertos pelo afastamento das Forças Armadas do controle de arsenais hoje em mão de milicianos, colecionadores e caçadores supostamente esportivos etc.. Nem menciono constar de sua folha de maus serviços a corrupção deslavada e ousada (isso se há de constatar, absurda que seja) com que age, de que o orçamento secreto é peça quase adicional. O uso de dinheiro público para comer gente, como ele o disse; as rachadinhas como prática prolongada; a tentativa de comprar vacinas com o recebimento de propina por agentes públicos que o servem; o pagamento por sua família de imóveis com dinheiro vivo, como se essa fosse a prática do mercado; o depósito de cheques na conta de sua mulher - tudo isso, e mais que não cabe aqui mencionar, tem a ver com a ação supostamente individual de Roberto Jefferson. Também deixo de fora deste comentário as reiteradas ofensas ao Poder Judiciário e às mulheres, membros da comunidade LGBTQI+A, pretos, quilombolas e pobres em geral. Mesmo palavras que a muitos sugerem certo pendor à pedofilia, ficam de fora, pois aspectos menos próximos do que entendo por políticos nem sempre podem ser misturados com as taras pessoais. Ao delegado de Polícia mais próximo cabe ir atrás dos que violam as leis penais. Se tudo for feito com a observância do devido processo legal, desmontam-se os golpes em curso e desmascaram-se os agentes de tanta crueldade e perversão.
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