
Certo tipo de patriotismo
Sem lembrar sequer de quem o disse pela primeira vez, sei que muitos consideram o patriotismo o último refúgio dos canalhas. Embora não compartilhe desse sentimento, espero pela resposta a um dos mais instigantes dilemas que o processo de globalização pôs diante da sociedade humana: o que resta de patriotismo, quando as próprias fronteiras físicas quase nada significam? Menciono apenas as fronteiras físicas, porque as outras há tempo foram rompidas. Bastaria mencionar simplesmente a migração dos capitais, percorrendo o mundo em 24 horas. Ali compra consciências e mandatos, acolá desaloja tradicionais ocupantes dos territórios originais. Sempre com a voracidade e a violência de que se gabam os acumuladores, firmes na já comprovada crença: o capital não tem pátria, nem coração. Um artigo de fé, portanto. O que me põe em dúvida tem pouco a ver com os tempos em que era possível admitir alguma sinceridade na proclamação do patriotismo. Mesmo sem esquecer que em nome dele Hitler matou milhões de judeus e de outros povos. O que sugere maior dificuldade em pensar do patriotismo e dos que se dizem patriotas, ao mesmo tempo em que rendem homenagens para os símbolos nacionais de outros países e dilapidam o patrimônio comum do país em que nasceram e vivem. Reservando alguns segundos para vangloriarem-se de ter combatido o líder alemão de cujas práticas se revelam aplicados discípulos. Resisto à ideia de associar a canalhice ao patriotismo. Não há demonstrações suficientes, porém, de que tal relação enfrentará resposta negativa, se os exemplos de proximidade entre os dois – canalhice e patriotismo – não cessa e cada dia se vai estreitando.