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BELÉM SOB ATAQUE— E O BRASIL PRECISA RECONHECER O QUE REALMENTE ESTÁ EM JOGO


Por Marcelo Botelho


Há algo profundamente revelador na maneira como parte da imprensa brasileira insiste em tratar a COP30 em Belém: não é crítica, é ressentimento travestido de jornalismo. Em vez de analisar o impacto geopolítico de sediar a maior conferência climática do planeta na Amazônia — justamente no lugar onde o futuro do clima global será decidido — preferem vasculhar caricaturas antigas, reforçar estereótipos e transformar dificuldades estruturais em munição para desqualificar o Pará.

É o velho vício de sempre: quando a Amazônia se ergue, alguns tentam trazê-la de volta ao chão.

Sim, Belém tem desafios. Todos sabem. E não há um paraense que os negue. Mas é curioso observar como os mesmos veículos que apontam o “fedor da pedra do peixe” no Ver-o-Peso silenciam sobre o colapso crônico do sistema de transportes em São Paulo, a violência epidêmica do Rio de Janeiro ou a miséria que se avoluma nas calçadas de Brasília. Quando o problema é no Sudeste, a narrativa é “complexidade urbana”; quando é no Norte, vira “incapacidade”.

Ora, isso não é crítica: é hierarquização geográfica.

E por trás dessa hierarquia, esconde-se um incômodo maior: ver a Amazônia ocupar o centro do mundo.

A COP30 trouxe chefes de Estado, diplomatas, cientistas, empresas globais, investidores e organizações internacionais. Trouxe obras estruturantes que há décadas Belém esperava. Trouxe visibilidade e responsabilidade. Trouxe um legado que não termina quando as delegações forem embora — permanece em infraestrutura, turismo, mobilidade, saneamento, economia e, sobretudo, autoestima.

Porém, em vez de enxergar esse momento como uma oportunidade brasileira, parte da imprensa preferiu transformar o Ver-o-Peso em metáfora da inferioridade amazônica; usar pessoas em situação de rua como ferramenta retórica; ridicularizar o calor amazônico, como se ondas de 40°C não assolassem o Sudeste; debochar das chuvas diárias, como se enchentes não fossem rotina em São Paulo; e, mais recentemente, transformar Outeiro em símbolo do atraso, ignorando deliberadamente o óbvio: trata-se de uma área historicamente negligenciada que, pela primeira vez em décadas, recebe atenção, investimentos e um redesenho urbano que mudará sua história.

Os transatlânticos MSC Seaview e Costa Diadema atracados no porto internacional da Sotave não são improviso — são símbolo de transformação. São o marco inicial de um novo eixo turístico e econômico. Outeiro está se tornando porta de entrada de navios internacionais, e isso não apenas reposiciona a ilha: projeta um novo futuro para toda a orla de Icoaraci e do próprio distrito, que ganha mobilidade, serviços, revitalização e oportunidades reais.

Mas isso, claro, não vira manchete.

Porque para certos setores da mídia, o Pará só pode aparecer sob a lente da precariedade. O progresso incomoda quem aprendeu a enxergar o Brasil de costas para a Amazônia.

Belém não precisa ser perfeita. Nenhuma sede de COP foi. Mas Belém é necessária. E por isso está onde está: no centro do debate global sobre clima, justiça ambiental, povos tradicionais, Amazônia urbana e desafios reais — não fantasmas editoriais.

A imprensa pode — e deve — apontar falhas, cobrar melhorias, comparar modelos, expor erros. Mas quando deixa de oferecer caminhos, perder o interesse em entender contextos e passa a usar dificuldades como instrumento de humilhação, deixa de ser crítica e vira ataque.

A COP30 não é um prêmio para Belém: é uma responsabilidade. E Belém está honrando essa responsabilidade com trabalho, obras, logística, articulação diplomática e abertura ao mundo.

Que parte da imprensa ainda não aceite isso? Problema dela. O Brasil que pensa o futuro já entendeu: a Amazônia não é periferia — é centro estratégico do planeta.

E Belém, queira ou não quem resiste ao Norte, está mostrando isso ao mundo.

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