A ZONA FRANCA DE MANAUS SOB A ÓTICA DOS PATRÕES
- Professor Seráfico

- há 4 dias
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O patronato nem esperou o temporal de domingo passado para retrucar meu artigo sobre as disparidades entre o faturamento do distrito industrial e a pobreza imperante na capital do Amazonas. Tratou de entrar na microeconomia e na negação dos números para tentar camuflar o óbvio.
Como estamos tratando de concepção, dispenso a fulanização, pois a ideia de um empresário (capitalista) reflete o pensamento dominante do sistema econômico. Para sair do debate sobre a relação capital/trabalho, a escolha é e sempre foi pelo caminho da lamúria com os gastos com salários, os custos de operação, a logística, etc. Uma conversa pequena para não encarar a questão fundamental.
Um desses empresários chega a dizer que a média salarial do PIM é de 3.400 reais e esse valor "situa-se entre os setores que melhor remuneram na economia amazonense". Uma comparação rasa, tendo como referência a mais-valia absoluta, como aquela que domina o comércio varejista de Manaus. Pouco mais de dois salários mínimos como sinal de "bom pagamento" é a cara da exploração exacerbada e cínica.
Ainda no artigo publicado pelo patrão, para tentar justificar o "boom" no faturamento do PIM em 2025 e a injustificável pobreza de mais de 60% da população manauara, o problema social é jogado para a política. Não acho que seja por ignorância, mas se trata de um recurso discursivo para encobrir a desigualdade provocada por relações profundas de exploração do trabalhador do distrito industrial e de outros ramos da economia amazonense.
O problema é econômico. Isso está na economia clássica, desde Adam Smith. O empresário sabe disso. Está na relação capital/trabalho, no lucro excessivo obtido a partir da força de trabalho do operário e de todo trabalhador. A política é um aporte do sistema econômico, pronto para lhe oferecer benesses, incentivos e isenções fiscais. Na visão capitalista clássica é assim, mas o sistema não foi criado para se manter imutável. O capital tem que ter outras funções, que não seja a da busca tresloucada pelo lucro, senão "um dia a cada cai".
Outro empresário, este do ramo da manipulação digital de dados, enveredou pelo caminho que já percorre há décadas e que lhe rendeu fortuna: Negar as estatísticas e manipular os números.
Não fui eu que disse que Manaus tem o pior rendimento familiar per capita entre todas as capitais do Brasil, foi o IBGE e com farta divulgação pela mídia. Também não fui eu que disse que Manaus tem a 4ª e a 7ª maiores favelas do país, foi o Censo 2022 do IBGE. Cidade de Deus/Alfredo Nascimento tem 55.851 moradores e a Comunidade São Lucas tem 53.674 moradores. A Rocinha, no Rio de Janeiro, é a maior do Brasil, com 72.021 moradores. Não sou eu que tenho o hábito de deformar estatísticas.
Os resultados do Censo 2022, do IBGE, continuam sendo publicados. Não é exclusividade minha conhecer os números, mas não me venham negar os dados, numa tentativa pueril de camuflar um problema que é resultado da extrema desigualdade social no país, provocada pela concentração de renda. Sei que faturamento não é lucro, mas não me venham dizer que dos 200 bilhões faturados pelas empresas do distrito industrial de Manaus, poucas centenas de patrões não vão embolsar pelo menos 10% desse valor, ou seja, 20 bilhões de reais.
A ótica do patronato é aquela de que emprego é dádiva do empresariado e não um recurso para lhe gerar lucro. A oferta de 130 mil empregos, com salário médio de 3.400 reais, e o faturamento de mais de 200 bilhões de reais das empresas é a prova de que o trabalhador fica apenas com o valor de duas ou três horas trabalhadas por dia. O restante das horas (5,6 horas) vira lucro para o dono da indústria. Isso é exploração extrema. Bem que o trabalhador poderia receber um salário por mais horas trabalhadas, numa jornada 5x2, no mínimo.
Concluo, agradecendo as inúmeras mensagens, comentários em redes sociais, ligações que recebi me parabenizando pelo texto corajoso de meter o dedo na ferida, já que políticos, acadêmicos e líderes sindicais permanecem calados, sem discutir qual modelo econômico pode gerar mais qualidade de vida para nossa gente. Do jeito que está, o Polo Industrial de Manaus apenas reproduz pobreza.
Lúcio Carril
Sociologo

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