top of page

O bicho*

Levaram o bicho para casa

doíam neles a esqualidez do bicho

as sarnas daquele ser vivo

desesperado

tão relegado à solidão

que nem os outros de sua

espécie

ousavam aproximar-se


Reservaram o lugar mais quente

deram-lhe conforto e atenção

como jamais tivera

o alimento lhe foi servido

como jamais o fora

irados e roucos

dessa vez seus uivos foram

ouvidos


Generosos

carregaram o bicho em seus braços

cumularam-no de carinho

como se acarinham os inocentes

assim o bicho cresceu

tornou-se forte

aumentaram-lhe as mandíbulas

os dentes se fizeram afiados

cortantes uns, molentes outros

agora poderia morder

as mãos que o afagaram

as bocas que o beijaram

o bicho saiu por aí

sem poupar mordidas

derramou o sangue

dos que lhe deram

de comer...

_______________________________________________

*Poema publicado originalmente em Veleidades Poéticas. São Paulo. Editora Scortecci, 2021, p.120.




18 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Desperdício

José Seráfico Não se admirem se alguém disser que isso é normal nem se surpreendam com a indiferença diante de tanto mal o que se tem feito à infância às velhas e velhos às mulheres aos negros promoçã

Quando e onde

Quantos serão os mortos? Onde explodirá a próxima bomba? Quando? Quantos se juntarão às centenas de milhares o vírus armado de natural letalidade cumprindo parte da tarefa a que outros (vírus ou verme

Porvir anunciado

Quero comer todo dia sonho com vida feliz o direito de sorrir é isso o que o povo diz e vê no que está por vir quando janeiro surgir De Porto Alegre, Florianópolis, dos Pampas, de Curitiba do Acre e d

bottom of page