Dos que se sabem agentes da história pode cobrar-se compromisso por desenhar e construir o futuro. Nem todos, porém, têm a coragem que alimenta essa construção, obra coletiva por excelência. A ela não podem dedicar-se os que sequer entendem a que corresponde a utopia, esse lugar aonde ainda não chegamos. Um dia, é certo que a ele poderemos chegar, desde que façamos o necessário. Talvez não ocorresse a Leonardo da Vinci que seu sonho de pôr o homem a passear pelos ares, imaginar sequer quando isso seria realizado. Hoje, encurtam-se distâncias antes pensadas intransponíveis, não mais que a concretização do que fora uma utopia. Só passa pela cabeça do homem tudo quanto ele sabe que um dia pode acontecer. É a História que nos tem revelado essa, talvez uma das poucas verdades estabelecidas e válidas enquanto o homem for chamado a participar da aventura da vida e lhe for dada a inteligência, infelizmente tão mal distribuída. Também é certo que todos a temos, mesmo que em quinhões diferentes. Estas primeiras palavras servem para pôr em foco um dos retratos mais desgraçados de nossa tragédia, a tragédia que nem por seus efeitos sobre todos, repete a desproporcionalidade referida sem gerar igual compromisso. Refiro-me especialmente ao número de mortos pela violência no Brasil, em 2020. Contaram-se 43 mil as vítimas, sob qualquer aspecto quantidade assustadora e sob qualquer título vergonhosa. Isso tudo, quando a morte por outras causas, como a pandemia, ceifa a vida de centenas de milhares de pessoas, seres humanos - embora poucos se deem conta disso. Todos morreremos um dia, é o argumento dos genocidas. Poupemos muito da espera da certeza em data incerta. Eis como se expressa a utopia dos matadores. Se têm que morrer, morram pela ação do projétil bem alimentado ou vítimas de um vírus. Tanto faz! Leonardo da Vinci às avessas, nem por isso faltará aos proclamadores dessa utopia e executores das ações que lhes correspondem, o sonho que para os outros é pesadelo. Porque a realidade construída por todos é a transformação do que antes passou na cabeça do homem. Façamos as contas: a covid-19 matou 240 mil pessoas, de março de 2020 até agora, pouco mais de 11 meses depois. Cerca de 727 pessoas por dia. A violência levou à sepultura 118 pessoas a cada dia. No primeiro caso, uma causa natural; por ação deliberada, no outro. A busca da vacina, afinal inventada, entreteve os cientistas, pesquisadores, médicos e profissionais da saúde. Todos, gente dedicada à cura e à vida, sua e de seus semelhantes. Do outro lado, a liberação do comércio e porte de armas de fogo, a facilidade em comprar o alimento desses artefatos da morte, a busca da legitimação do assassínio inimputável, a organização de grupos promotores da morte. Cada qual tem a utopia que faz mais bem à sua carência de alma.
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