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Traje e conduta

Tem-se qualificado a década dos 90 do século XX como perdida. Os maus resultados da economia e a trajetória percorrida frustraram a expectativa e as esperanças que nossas riquezas naturais e as lições proporcionadas pela História poderiam gerar em nossos sentimentos, pensamentos e condutas. No primeiro daqueles anos batia à porta de todos os países a oportunidade de entendermo-nos todos como passageiros da mesma nau - Gaia para uns, Terra para outros. O processo a que alguns dão o nome globalização, outros chamam mundialização prometia movimento ainda mais acelerado. Já pareciam removidos os percalços e pedregulhos, as superstições e preconceitos construídos no demasiadamente longo período da chamada Guerra Fria. Era justo esperar que os fantasmas de Stálin, Mussolini e Hitler jazem-se para sempre em seus túmulos, com eles levando as atrocidades de que foram capazes. Passadas mais de duas décadas do século XXI, é forçoso constatar e reconhecer quanto o passado ainda pesa sobre a sociedade, levando ladeira abaixo o que poderia ter servido de lição. Conhecimento, sabedoria e futuro, mais em uns países que em outros, estão fora do prestígio e da consideração dos povos. No Brasil, em escala e profundidade muito maiores, de que dão conta os acontecimentos que somos obrigados a testemunhar. Desconforta-me dizer que vencida a segunda década, nosso País é palco de revelações pouco animadoras. Não trarei a pelo muitos exemplos, pois prefiro pinçar na recente e polêmica nota do Ministro da Defesa o mote. Por mais acaciana que seja, a afirmação de que é preciso analisar os fatos em relação ao contexto em que eles ocorrem é de suma importância. Permanecer entoando loas à tortura e às formas autoritárias de exercer e manter-se no poder é trazer para agora contexto há muito ultrapassado. Bastam, aos que desejam aprender, o que já está nos livros. Sem que se dispensem novas interpretações e considerações sobre o assunto. Mesmo a dificuldade de ouvir manifestações que diferem do aplauso sempre desejado não autoriza tratar a realidade de hoje como se estivéssemos no ontem. Ainda mais, quando os fatos do passado não guardam qualquer identidade com as aspirações e as necessidades de um mundo em permanente mudança. Tivesse a Terra forma diferente da que Galileu proclamou, nem assim é admissível tê-la como palco de ocorrências semelhantes às que a História manda ter sepultadas. Dirijo-me, em especial, ao prestígio das Forças Armadas brasileiras, sábia ou equivocamente apreciadas, com sua imagem agora posta em questão. Por maior que seja o esforço de interpretação, é constrangedor vê-las afastarem-se de seus deveres e limites constitucionais, com a agravante de que podem levar brasileiros bem-intencionados à percepção de que são um estorvo ao necessário aprofundamento da democracia, tantas vidas custou devolver esta condição aos nacionais. A sociedade, mais que um direito, tem o dever de cobrar dos servidores públicos armados o cumprimento exato do que se estabelece na Constituição e nas leis que a completam. Tanto quanto o tem, em relação aos servidores civis. Não apenas porque, ao fim e ao cabo, do soldado ao marechal, é com o suor de todos que se lhes pagam - a todos, da mesma forma - os serviços prestados. O sentimento de cidadania - alguns chamam patriotismo, enquanto se ajoelham diante do pavilhão estrangeiro - o exige, seja qual for a roupa profissional trajada.

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