Orlando Sampaio Silva
Uma leitura instigante. Jamais eu imaginara que leria os diários de quem quer que fosse. Neste caso, como conheço as obras fundamentais do autor e sabia algo sobre sua vida, decidi iniciar a leitura experimentalmente. Logo eu me achei envolvido em narrativas, revelações, confissões íntimas, registros e atos de criações ficcionais que me prenderam em uma longa e interessada leitura das 573 páginas da obra. A leitura foi longa pela extensão do livro, mas, também, como costumo fazer, pelas anotações, comentários, reflexões escritas que fui procedendo ao longo de todo o procedimento da leitura. Não se trata de simples diários com apenas anotações de feitos, observações superficiais ou acontecimentos de que o autor foi personagem. É muito mais. Eu tenho dito: trata-se de um documento complexo da maior importância, que deveria ter caído nas mãos de outro judeu sábio, o Feud. Ele teria um material riquíssimo para suas interpretações psicanalíticas. Evidentemente, trata-se de um documento da maior utilidade para os críticos literários, que com as revelações constantes dele, têm material fundamental para mergulhar nas análises críticas da obra kafkiana. A obra de Kafka, por sua densidade e complexidade, deu origem à expressão qualificativa “kafkiano”, um adjetivo adequado para qualificar obras ou situações complexas, difíceis, complicadas, “pesadas”, também psicologicamente controversas. É que esse autor tinha em suas características pessoais todas essas facetas. Foi um ser humano, um jovem escritor extremamente consciente e ávido de sua produção, mas, ao mesmo tempo, foi um sofredor. Ele sofreu em suas relações humanas, desde as familiares (particularmente com seu pai), até seu isolamento, sua solidão no mundo. Nasceu em Praga, em uma família de língua alemã. Escrevia em alemão. Ele criava textos ficcionais com grande avidez, dando início a textos que poderiam tronar-se contos, novelas ou romances, porém, em seu emaranhado psicológico comportamental, em geral, não completava suas produções. Foi um homem complicado e sofredor, como filho, como profissional do Direito, como escritor, como namorado e como noivo. Teve mais de uma noiva, mas morreu solteiro. Era um homem ávido pelas mulheres, mas tinha grande dificuldade nos seus relacionamentos, inclusive sexuais, com elas. Morreu aos 40 anos de idade, sufocado pela tuberculose, da qual se tratou à maneira do seu tempo, com estadas no campo (em sanatórios ou não), desfrutando a vida ao ar livre, caminhando em meio à natureza. Deixou uma obra da maior importância, das quais as mais importantes são “O Processo”, “O Castelo, e “A Metamorfose”. Li, também, uma parte do “América”, que se encontra em seu diário, e muitos fragmentos de obras que, ou se encontram nestas referidas ou não. Sua obra exprime ou contém a sua complexidade como ser humano, a sua genialidade como escritor e a sua vida de sofredor. Ele não ter escrito uma obra romântica, pelo contrário, mas é difícil de classificá-la em termos dos cânones vigentes na teoria literária; eu diria que ela é uma obra “kafkiana”! Ele, em seu diário, vivencia alguns momentos de poesia plena! O fundamental da obra kafkiana foi publicado e organizado após a sua morte, por seu testamenteiro e amigo Max Brod (também escritor), apesar de Kafka lhe ter pedido, antes de morrer, que queimasse o que ele havia escrito! É um dos maiores escritores do Século XX
Comments