Revolução à francesa
Ruas próximas á praça da Bastilha, em Paris, transformaram-se em campo de batalha na tarde do último sábado. A manifestação popular tentava impedir a imposição de lei de proteção das forças policiais e repressoras daquele país. Nada mais, nada menos que a proibição da filmagem de ações policiais no enfrentamento de manifestações de rua. Algo semelhante, pelo menos quanto à inspiração, ao que pretendia o ex-sinistro da (in)Justiça, (escassa) Cidadania e Segurança (seletiva) Pública. Ao reprimir a expressiva mobilização, as forças repressoras francesas ilustraram os motivos por que a sociedade rejeita o projeto do governo Emmanuel Macron. Não se tratasse de conduta que se espalha mundo afora, surpreenderia o fato de ser a França o palco dos acontecimentos. Não apenas porque, faz 231 anos, de lá veio a inspiração fundadora da chamada Idade Contemporânea. Pelo menos para a Europa e o Ocidente, os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade passariam a orientar as ações de todos, governantes e governados. Também em razão das barricadas de maio de 1968 e do impacto que o sucedeu, pareceria surpreendente chegar-se à situação revelada agora na praça da Bastilha. O desprezo de certas circunstâncias e a suposição de que o ser humano aprende com facilidade, todavia, leva-nos a desdenhar de fenômenos que nós mesmos temos indicado e denunciado. Por isso, a contaminação e a disseminação de formas de comportamento e maneiras de ver o mundo determinadas pelo acelerado processo de globalização caem no esquecimento. Facilitam, assim, a revogação do compromisso das gerações sucessivas com o lema e os ideais inaugurais dos novos tempos, em 1789. Nessa onda, a direita se espalha e, aqui e acolá, aprofunda a desigualdade que tanto lhe interessa e cujo combate a todo custo tenta evitar. Mais de uma vez mencionei – e não considero exagero reiterar – terem os detentores do capital mais que os trabalhadores, ouvido e seguido a advertência de Karl Marx. Graças a isso, não só têm criado novos e mais perversos meios de exploração, capturado o aparelho estatal, erigido o espaço onde compra-e-venda impõem as regras, como ainda reagem à menor tentativa de resistência, com as armas pagas pelos que trabalham. A França não ficou de fora.