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REGISTROS HISTÓRICOS DA FORMAÇÃO E DA VIDA DO POVO HEBREU/JUDEU



ESTUDOS DE HISTÓRIA

Orlando SAMPAIO SILVA

- I I I P A R T E

A B R A Ã O

Abraão, conforme algumas fontes, existiu entre os séculos XXI e XVIII a. C. Pode-se encontrar registros de que ele teria vivido em um período que vai de 1.812 a 1.637 a. C., em uma vida muito longa. Aliás, conforme está escrito no Antigo Testamento, todos os Patriarcas viveram por largos períodos de tempo. Para exemplificar – Adão: 930 anos, Matusalém: 969 anos, Noé: 950 anos, Abraão: 175 anos, seu filho Isaque: 180 anos etc. Repare-se que aos personagens mais antigos, cujos registros se encontram nos confins da mitologia do Gênesis, são atribuídas idades inimaginavelmente prolongadas (v. acima), enquanto que aos que estão inseridos em um contexto mais histórico ou menos mítico e ficcional, como Abraão e Isaac, são anotadas idades cronológicas bem menos extensas. Ainda que essas longas idades sejam fantasiosas com conotações míticas, ou que o conceito de “ano de idade” fosse outro, diferente do que veio a ser adotado mais tarde até o presente - que corresponde à anualidade das estações do ano que está acoplada à translação da Terra em torno do Sol -, é revelador o registro que vem a seguir, que se reporta à mitologia sumeriana. O semideus sumeriano Gilgamesh buscava instituir o paradigma da imortalidade humana (Epopeia de Gilgamesh). Esta, a imortalidade, como se viu, esteve perto de concretizar-se nas longevidades dos Patriarcas hebreus! Este item da história mítica de Gilgamesh mais uma vez aproxima as tradições sumerianas das hebraicas. A narrativa sobre os patriarcas está vinculada à Suméria, lembrando-se que, como é sabido, Abraão nasceu e viveu em Ur (como muitos outros patriarcas). Por outro lado, diga-se que apenas com essas hipotéticas longas vidas bíblicas seria possível o estabelecimento do encadeamento desta linhagem de pais e filhos (os patriarcas), navegando no mito através das gerações, desde Adão até Abraão, Isaac e Jacó. Não fosse este artifício temporal e não teria havido uma quantidade de gerações encadeadas (que sobrevivessem, digamos, em vidas normais) suficientes para cobrir este período tão longo. Porém, a mitologia não é necessariamente, lógica e racional, ela é inventiva e poética...

Nas primeiras referências bíblicas, o patriarca líder condutor é citado com o nome Abrão (“pai exaltado”). Depois de muitos episódios em sua história de vida, ele passou a ser nomeado com o antropônimo Abraão (“pai de muitas nações”). Consta da Bíblia registro de dois povos dos quais Abraão teria sido o “pai fundador”, os Hebreus e os Árabes.

As civilizações mesopotâmicas foram a Suméria, a Caldeia, a Assíria e a Babilônia. As duas primeiras fixadas ao sul e as outras duas ao norte da região, entre os rios Eufrates e Tigre. Estas civilizações se interinfluenciaram cultural e socialmente. A Assíria e a Babilônia, p. ex., absorveram a escrita com caracteres cuneiformes, que eram registrados em tabuinhas de argila, em textos em prosa e em poesias. Esta escrita e esta forma de escrever haviam sido invenções sumerianas. Estes símbolos gráficos (cuneiformes) constituíram-se em um passo cultural crucial que propiciou a transposição por este povo da pré-história para a história, a passagem da barbárie para a civilização. Os povos e as sociedades e culturas dessas civilizações terminaram por assimilar-se uns aos outros, umas às outras, desaparecendo uns, como os Caldeus, que foram assimilados aos Babilônios, outros sobrevivendo por mais algum tempo. Sendo Abraão e os demais patriarcas (na linhagem ascendente a partir de Abraão) naturais da Mesopotâmia, eles conviveram com esse cadinho cultural, com ênfase na cultura de seu povo, os sumerianos. Sendo Abraão natural de Ur, sua língua era o sumeriano.

A primeira mulher de Abraão foi Sara. Sara era meio irmã de seu marido Abraão. Sara e Abraão eram ambos filhos de Terá, razão porque este era um casamento incestuoso. Diga-se, no entanto, que só muito tempo depois este tipo de relacionamento viria a ser objeto dos tabus de incesto entre os judeus. Sendo Sara infértil, ela ofereceu a sua escrava egípcia Hagar ou Agar para ser concubina de Abraão. Sara, já idosa, com a ação dos poderes divinos, veio a ser mãe de Isaac. A segunda esposa de Abraão foi Quetura, com quem ele casou ao tornar-se viúvo com a morte de Sara. O casamento com Quetura gerou os seguintes filhos: Zinrã, Jocsã, Medã, Midiã, Jisbaque e Sua. Estes filhos de Abraão se tornaram chefes de tribos árabes. A essa época a etnia arábica se encontrava em seus primeiros tempos, na fase primeva de sua formação como o povo Árabe. O concubinato do Patriarca com Hagar veio a gerar Ismael. Este filho de Abraão teve doze filhos, e estes se tornaram príncipes árabes.

O povo árabe, nestes termos, é de procriação abraâmica. Para os árabes, Abraão se chama Ibrahim. Os árabes, que professam a religião mulçumana, são monoteístas. O Velho Testamento é um livro sagrado na religião hebraica (a Torá), é também sagrado na religião muçulmana (consta, em parte, do Alcorão) e, no cristianismo em suas diversas configurações religiosas, sendo todas estas religiões monoteístas. Estas religiões - hebraica, islamismo e cristianismo - são consideradas as religiões abraâmicas.

Abraão foi considerado o “pai de muitas nações”.

Nas denominações religiosas cristãs existe o Novo Testamento, com narrativas a partir de Jesus.

De conformidade com a narrativa bíblica, Abraão recebeu de Deus a missão fundadora de conduzir o “povo escolhido” para Canaã, a Terra Prometida. Em Canaã deveria viver o “povo de Deus”, os Judeus. Nos episódios referentes a esta determinação e na concretização da missão, estão os fatos antecedentes da formação do povo judeu, ou seja, eles são os prolegômenos da constituição do povo Hebreu ou Judeu. Esta região se situa no “crescente fértil”. Até então, não havia referência à existência do povo judeu enquanto tal. Conforme a versão bíblica fundadora, existiam descendentes de Sem (o filho de Noé que teria dado origem aos Hebreus), famílias de Patriarcas ao longo de nove gerações, até a emergência do “fundador”, o sumeriano Abraão. A ida de Abraão com seu pai, acompanhado de seu sobrinho Ló ou Lot e toda a parentela, que vivia em Ur, para a Terra Prometida é o signo bíblico que aponta para a constituição do povo Hebreu/Judeu. Registre-se, no entanto, que apenas a três gerações depois de Abraão, com os filhos de Jacó (sendo este, neto de Abraão), é que se efetivariam fatores concretos, substantivos fundadores do povo Hebreu, Israelita ou Judeu. Foi a partir das ações dos filhos de Jacó que o povo judeu começou a constituir-se enquanto coletividade humana numerosa com identidade própria caracterizada pela crença religiosa monoteísta, conforme veremos neste estudo. No entanto, veja-se: A religião hebraica, formulada com cânones e valores formais, com cerimonial e com corpo sacerdotal, apenas surgiria muito depois, com Moisés.

Então, conforme vimos acima, até a ida de Abraão com a sua parentela para Canaã, não havia os Judeus ou Hebreus como um povo, uma grande coletividade étnica constituída. Aquelas pessoas acima enumeradas até Jacó foram os bíblicos Patriarcas, chefes de suas famílias, que vinham de uma tradição originada na “criação” e que passara por Noé. No “Gênesis”, Adão teria sido o início do processo ao receber a missão de “crescer e multiplicar”. Oito gerações de Patriarcas mais tarde, Noé recebeu a missão divina de salvar-se com sua família e exemplares dos demais animais viventes, no dilúvio (cf. acima); até que Abrahão, atendendo ao chamado de Deus, dirigiu-se com sua família nuclear e extensa, ou seja, com toda a sua parentela para a Terra Prometida, em Canaã, onde viviam os Cananeus e uma multiplicidade de outros pequenos povos. Como prometer a um povo, que ainda viria a ser constituído, uma terra que já tinha ocupantes, pois havia povos que nela habitavam?! Mas, assim está nas Escrituras!

Tendo chegado a Canaã, Abraão, acompanhado de Ló e de Sara, percorreu as terras de norte a sul e, nesta terra, encontrou o povo Cananeu e diversos outros povos, aí preexistentes. Ali chegara Abraão apenas com sua parentela, uns poucos, uma família extensa... e aí nasceram seus filhos.

Retomando a questão da linguagem: É dedutível, é evidente, que estas personagens bíblicas até então existentes se comunicassem entre si na língua sumeriana. Pela lógica interpretativa da história, é evidente que elas foram falantes desta língua e vieram a comunicar-se na língua cananeia. A língua sumeriana veio com os conduzidos de Ur e, no convívio com os cananeus ou canaanitas, em Canaã, operou-se a incorporação da língua cananeia.

A este tempo, a humanidade se encontrava na Idade do Bronze. Canaã, onde se localizava a “terra prometida”, se situava onde, nos dias atuais, encontra-se o Estado de Israel, no Oriente Médio.

A etnia que estava sendo instituída eram os Hebreus (nome decorrente do patriarca Éber ou Heber), ou Israelitas (em face do patriarca Jacó, que depois passou a chamar-se Israel, cf. acima) ou Judeus (em decorrência de Judá, filho de Jacó e fundador de uma das doze tribos, cf. abaixo). Como se percebe, trata-se de uma busca bíblica de explicar as três denominações pelas quais se tornou conhecido um único povo. Heber, Jacó e Judá integram os antecedentes da formação do povo Hebreu/Israelita/Judeu. Considere-se que a palavra “Hebreu” tem sua origem na língua hebraica, sendo uma transformação da palavra “Ivrim” que, neste idioma, significa “povo do outro lado do rio”.

Abraão e sua gente, na jornada do deslocamento para Canaã, pararam em alguns lugares, acamparam, em locais tais como Siquém, Betel, Harã (este ficava onde hoje é o território da Turquia), Ai e Salém. Este último era o local de Jerusalém, conforme veremos.

Neste tempo, Canaã foi assolada por grave crise na produção de alimentos, o que provocou fome na região. Em face dessa situação, Abraão em companhia de Sara e do sobrinho Ló dirigiram-se ao país vizinho, o Egito, onde ele apresentou Sara apenas como sua irmã (que era de fato, além de esposa). O faraó (rei) do Egito conheceu-os e, com o consentimento do marido, adotou Sara como se fosse sua esposa. Costumes da época (?). Depois de ter recebido as benesses do faraó, Abraão se desentendeu com ele, que passou a maltratá-lo. Então, o faraó devolveu Sara a Abraão e permitiu que os dois e Ló retornassem a Canaã.

Observação: Para deixar claro e evitar equívocos quanto às épocas de ocorrências de eventos que integram o processo etnogênico ora em explanação, registre-se que a ida de Abraão e Sara ao Egito ocorreu muito antes dos conhecidos acontecimentos centrados em José do Egito e da ida de Jacó com sua família para o Egito. Esse tempo da vida de Abraão é outra época muito anterior, pois Abraão ainda viria a ser pai de Isaque, que, por sua vez, será pai de Jacó, e José era filho de Jacó. Evidentemente, são dois momentos fundamentais nos antecedentes da formação do povo judeu, que têm idas ao Egito como referência, mas tratam-se de momentos distantes um do outro no tempo constitutivo deste povo.

Abraão e Sara, de volta à Terra Prometida, instalaram-se em Gerar, onde ambos se envolveram em uma situação semelhante à que viveram no contato com o faraó do Egito. Na nova complicação, consta como personagem local Abimeleque, o rei de Gerar. Esta cidade era o principal centro urbano dos Filisteus, povo que também vivia em Canaã. Abraão, mais uma vez, dizia ser Sara sua irmã e não, sua esposa, e o rei filisteu se interessou por ela. O rei, por um tempo, protegeu Abraão, mas vieram a entrar em conflito, razão porque o patriarca com os seus familiares foram viver em Betel (que ficava nas terras nas quais, muito tempo depois, veio a viver a Tribo de Efraim, cf. veremos). Nesta cidade, Abraão ficou rico negociando seus rebanhos e se tornou um líder político de grande carisma.

Abraão morreu em Canaã, no campo de Efron, em Hebron, nas montanhas da atual Palestina, onde foi sepultado, provavelmente, no ano de 1.637 a. C.


[CONTINUA. Próximo capítulo: “Sodoma e Gomorra”]

G-mail: osavlis@gmail.com




Orlando SAMPAIO SILVA

- I I I P A R T E

A B R A Ã O

Abraão, conforme algumas fontes, existiu entre os séculos XXI e XVIII a. C. Pode-se encontrar registros de que ele teria vivido em um período que vai de 1.812 a 1.637 a. C., em uma vida muito longa. Aliás, conforme está escrito no Antigo Testamento, todos os Patriarcas viveram por largos períodos de tempo. Para exemplificar – Adão: 930 anos, Matusalém: 969 anos, Noé: 950 anos, Abraão: 175 anos, seu filho Isaque: 180 anos etc. Repare-se que aos personagens mais antigos, cujos registros se encontram nos confins da mitologia do Gênesis, são atribuídas idades inimaginavelmente prolongadas (v. acima), enquanto que aos que estão inseridos em um contexto mais histórico ou menos mítico e ficcional, como Abraão e Isaac, são anotadas idades cronológicas bem menos extensas. Ainda que essas longas idades sejam fantasiosas com conotações míticas, ou que o conceito de “ano de idade” fosse outro, diferente do que veio a ser adotado mais tarde até o presente - que corresponde à anualidade das estações do ano que está acoplada à translação da Terra em torno do Sol -, é revelador o registro que vem a seguir, que se reporta a mitologia sumeriana. O semideus sumeriano Gilgamesh buscava instituir o paradigma da imortalidade humana (Epopeia de Gilgamesh). Esta, a imortalidade, como se viu, esteve perto de concretizar-se nas longevidades dos Patriarcas hebreus! Este item da história mítica de Gilgamesh mais uma vez aproxima as tradições sumerianas das hebraicas. A narrativa sobre os patriarcas está vinculada à Suméria, lembrando-se que, como é sabido, Abraão nasceu e viveu em Ur (como muitos outros patriarcas). Por outro lado, diga-se que apenas com essas hipotéticas longas vidas bíblicas seria possível o estabelecimento do encadeamento desta linhagem de pais e filhos (os patriarcas), navegando no mito através das gerações, desde Adão até Abraão, Isaac e Jacó. Não fosse este artifício temporal e não teria havido uma quantidade de gerações encadeadas (que sobrevivessem, digamos, em vidas normais) suficientes para cobrir este período tão longo. Porém, a mitologia não é necessariamente, lógica e racional, ela é inventiva e poética...

Nas primeiras referências bíblicas, o patriarca líder condutor é citado com o nome Abrão (“pai exaltado”). Depois de muitos episódios em sua história de vida, ele passou a ser nomeado com o antropônimo Abraão (“pai de muitas nações”). Consta da Bíblia registro de dois povos dos quais Abraão teria sido o “pai fundador”, os Hebreus e os Árabes.

As civilizações mesopotâmicas foram a Suméria, a Caldeia, a Assíria e a Babilônia. As duas primeiras fixadas ao sul e as outras duas ao norte da região, entre os rios Eufrates e Tigre. Estas civilizações se interinfluenciaram cultural e socialmente. A Assíria e a Babilônia, p. ex., absorveram a escrita com caracteres cuneiformes, que eram registrados em tabuinhas de argila, em textos em prosa e em poesias. Esta escrita e esta forma de escrever haviam sido invenções sumerianas. Estes símbolos gráficos (cuneiformes) constituíram-se em um passo cultural crucial que propiciou a transposição por este povo da pré-história para a história, a passagem da barbárie para a civilização. Os povos e as sociedades e culturas dessas civilizações terminaram por assimilar-se uns aos outros, umas às outras, desaparecendo uns, como os Caldeus, que foram assimilados aos Babilônios, outros sobrevivendo por mais algum tempo. Sendo Abraão e os demais patriarcas (na linhagem ascendente a partir de Abraão) naturais da Mesopotâmia, eles conviveram com esse cadinho cultural, com ênfase na cultura de seu povo, os sumerianos. Sendo Abraão natural de Ur, sua língua era o sumeriano.

A primeira mulher de Abraão foi Sara. Sara era meio irmã de seu marido Abraão. Sara e Abraão eram ambos filhos de Terá, razão porque este era um casamento incestuoso. Diga-se, no entanto, que só muito tempo depois este tipo de relacionamento viria a ser objeto dos tabus de incesto entre os judeus. Sendo Sara infértil, ela ofereceu a sua escrava egípcia Hagar ou Agar para ser concubina de Abraão. Sara, já idosa, com a ação dos poderes divinos, veio a ser mãe de Isaac. A segunda esposa de Abraão foi Quetura, com quem ele casou ao tornar-se viúvo com a morte de Sara. O casamento com Quetura gerou os seguintes filhos: Zinrã, Jocsã, Medã, Midiã, Jisbaque e Sua. Estes filhos de Abraão se tornaram chefes de tribos árabes. A essa época a etnia arábica se encontrava em seus primeiros tempos, na fase primeva de sua formação como o povo Árabe. O concubinato do Patriarca com Hagar veio a gerar Ismael. Este filho de Abraão teve doze filhos, e estes se tornaram príncipes árabes.

O povo árabe, nestes termos, é de procriação abraâmica. Para os árabes, Abraão se chama Ibrahim. Os árabes, que professam a religião mulçumana, são monoteístas. O Velho Testamento é um livro sagrado na religião hebraica (a Torá), é também sagrado na religião muçulmana (consta, em parte, do Alcorão) e, no cristianismo em suas diversas configurações religiosas, sendo todas estas religiões monoteístas. Estas religiões - hebraica, islamismo e cristianismo - são consideradas as religiões abraâmicas.

Abraão foi considerado o “pai de muitas nações”.

Nas denominações religiosas cristãs existe o Novo Testamento, com narrativas a partir de Jesus.

De conformidade com a narrativa bíblica, Abraão recebeu de Deus a missão fundadora de conduzir o “povo escolhido” para Canaã, a Terra Prometida. Em Canaã deveria viver o “povo de Deus”, os Judeus. Nos episódios referentes a esta determinação e na concretização da missão, estão os fatos antecedentes da formação do povo judeu, ou seja, eles são os prolegômenos da constituição do povo Hebreu ou Judeu. Esta região se situa no “crescente fértil”. Até então, não havia referência à existência do povo judeu enquanto tal. Conforme a versão bíblica fundadora, existiam descendentes de Sem (o filho de Noé que teria dado origem aos Hebreus), famílias de Patriarcas ao longo de nove gerações, até a emergência do “fundador”, o sumeriano Abraão. A ida de Abraão com seu pai, acompanhado de seu sobrinho Ló ou Lot e toda a parentela, que vivia em Ur, para a Terra Prometida é o signo bíblico que aponta para a constituição do povo Hebreu/Judeu. Registre-se, no entanto, que apenas a três gerações depois de Abraão, com os filhos de Jacó (sendo este, neto de Abraão), é que se efetivariam fatores concretos, substantivos fundadores do povo Hebreu, Israelita ou Judeu. Foi a partir das ações dos filhos de Jacó que o povo judeu começou a constituir-se enquanto coletividade humana numerosa com identidade própria caracterizada pela crença religiosa monoteísta, conforme veremos neste estudo. No entanto, veja-se: A religião hebraica, formulada com cânones e valores formais, com cerimonial e com corpo sacerdotal, apenas surgiria muito depois, com Moisés.

Então, conforme vimos acima, até a ida de Abraão com a sua parentela para Canaã, não havia os Judeus ou Hebreus como um povo, uma grande coletividade étnica constituída. Aquelas pessoas acima enumeradas até Jacó foram os bíblicos Patriarcas, chefes de suas famílias, que vinham de uma tradição originada na “criação” e que passara por Noé. No “Gênesis”, Adão teria sido o início do processo ao receber a missão de “crescer e multiplicar”. Oito gerações de Patriarcas mais tarde, Noé recebeu a missão divina de salvar-se com sua família e exemplares dos demais animais viventes, no dilúvio (cf. acima); até que Abrahão, atendendo ao chamado de Deus, dirigiu-se com sua família nuclear e extensa, ou seja, com toda a sua parentela para a Terra Prometida, em Canaã, onde viviam os Cananeus e uma multiplicidade de outros pequenos povos. Como prometer a um povo, que ainda viria a ser constituído, uma terra que já tinha ocupantes, pois havia povos que nela habitavam?! Mas, assim está nas Escrituras!

Tendo chegado a Canaã, Abraão, acompanhado de Ló e de Sara, percorreu as terras de norte a sul e, nesta terra, encontrou o povo Cananeu e diversos outros povos, aí preexistentes. Ali chegara Abraão apenas com sua parentela, uns poucos, uma família extensa... e aí nasceram seus filhos.

Retomando a questão da linguagem: É dedutível, é evidente, que estas personagens bíblicas até então existentes se comunicassem entre si na língua sumeriana. Pela lógica interpretativa da história, é evidente que elas foram falantes desta língua e vieram a comunicar-se na língua cananeia. A língua sumeriana veio com os conduzidos de Ur e, no convívio com os cananeus ou canaanitas, em Canaã, operou-se a incorporação da língua cananeia.

A este tempo, a humanidade se encontrava na Idade do Bronze. Canaã, onde se localizava a “terra prometida”, se situava onde, nos dias atuais, encontra-se o Estado de Israel, no Oriente Médio.

A etnia que estava sendo instituída eram os Hebreus (nome decorrente do patriarca Éber ou Heber), ou Israelitas (em face do patriarca Jacó, que depois passou a chamar-se Israel, cf. acima) ou Judeus (em decorrência de Judá, filho de Jacó e fundador de uma das doze tribos, cf. abaixo). Como se percebe, trata-se de uma busca bíblica de explicar as três denominações pelas quais se tornou conhecido um único povo. Heber, Jacó e Judá integram os antecedentes da formação do povo Hebreu/Israelita/Judeu. Considere-se que a palavra “Hebreu” tem sua origem na língua hebraica, sendo uma transformação da palavra “Ivrim” que, neste idioma, significa “povo do outro lado do rio”.

Abraão e sua gente, na jornada do deslocamento para Canaã, pararam em alguns lugares, acamparam, em locais tais como Siquém, Betel, Harã (este ficava onde hoje é o território da Turquia), Ai e Salém. Este último era o local de Jerusalém, conforme veremos.

Neste tempo, Canaã foi assolada por grave crise na produção de alimentos, o que provocou fome na região. Em face dessa situação, Abraão em companhia de Sara e do sobrinho Ló dirigiram-se ao país vizinho, o Egito, onde ele apresentou Sara apenas como sua irmã (que era de fato, além de esposa). O faraó (rei) do Egito conheceu-os e, com o consentimento do marido, adotou Sara como se fosse sua esposa. Costumes da época (?). Depois de ter recebido as benesses do faraó, Abraão se desentendeu com ele, que passou a maltratá-lo. Então, o faraó devolveu Sara a Abraão e permitiu que os dois e Ló retornassem a Canaã.

Observação: Para deixar claro e evitar equívocos quanto às épocas de ocorrências de eventos que integram o processo etnogênico ora em explanação, registre-se que a ida de Abraão e Sara ao Egito ocorreu muito antes dos conhecidos acontecimentos centrados em José do Egito e da ida de Jacó com sua família para o Egito. Esse tempo da vida de Abraão é outra época muito anterior, pois Abraão ainda viria a ser pai de Isaque, que, por sua vez, será pai de Jacó, e José era filho de Jacó. Evidentemente, são dois momentos fundamentais nos antecedentes da formação do povo judeu, que têm idas ao Egito como referência, mas tratam-se de momentos distantes um do outro no tempo constitutivo deste povo.

Abraão e Sara, de volta à Terra Prometida, instalaram-se em Gerar, onde ambos se envolveram em uma situação semelhante à que viveram no contato com o faraó do Egito. Na nova complicação, consta como personagem local Abimeleque, o rei de Gerar. Esta cidade era o principal centro urbano dos Filisteus, povo que também vivia em Canaã. Abraão, mais uma vez, dizia ser Sara sua irmã e não, sua esposa, e o rei filisteu se interessou por ela. O rei, por um tempo, protegeu Abraão, mas vieram a entrar em conflito, razão porque o patriarca com os seus familiares foram viver em Betel (que ficava nas terras nas quais, muito tempo depois, veio a viver a Tribo de Efraim, cf. veremos). Nesta cidade, Abraão ficou rico negociando seus rebanhos e se tornou um líder político de grande carisma.

Abraão morreu em Canaã, no campo de Efron, em Hebron, nas montanhas da atual Palestina, onde foi sepultado, provavelmente, no ano de 1.637 a. C.


[CONTINUA. Próximo capítulo: “Sodoma e Gomorra”]

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