Os sulistas dizem que as coisas andam de ponta-cabeça. Significa que tudo está fora dos eixos. Aquela situação na qual se dizia que vaca estranha o bezerro. O que parecia ser não é; o que pensaríamos impossível de ver é o que estamos vendo. Vacas voando, por exemplo. Muitos seriam tentados a dizer vivermos num mundo não apenas virtual, mas fantástico, para muito além das telas de televisão e das outras, pintadas pelo catalão Salvador Dali. Quando as verbas públicas destinadas à Educação, à Saúde e à Ciência e Tecnologia são reduzidas em 4,8 bilhões de reais, sabemos que cantores sertanejos recebem cachês estratosféricos. Quando as atividades culturais amargam o empobrecimento dos que a elas se dedicam, porque lhes faltem recursos para produzir, polpudas importâncias financiam projetos de propaganda do armamento da população. Já não bastam os mortos que a covid-19, para cumprir o mandamento (argumento, às vezes) de que um dia todos morreremos, manda pros cemitérios. Nem os que, por balas que não se perdem, porque perdidas são as vidas de tanta gente inocente, servem ao discurso e às práticas eivadas de ódio. Nada tenho contra os cantores sertanejos. São apenas mais uma forma de cantar seus sofrimentos, suas alegrias, suas esperanças – talvez. Como no passado houve os que cantavam a fossa, o tempo de memoráveis sambas-canções. Não me parece justo, porém, menos ético ainda, que volumosos recursos públicos engordem contas bancárias de artistas capazes de reforçá-las a cada novo espetáculo. Os que compensam muitas vezes infâncias infelizes e carentes, aproveitando-se do talento com que nasceram e no qual apostaram. É justo que busquem na arte, qualquer seja ela, o trabalho de onde tirarão seu sustento e conseguirão garantir a velhice longe da Casa dos Artistas. Sem que falte aos outros, os menos afortunados, a tranquilidade e a segurança que as instituições de benefício poderão proporcionar. Não é justo, porém, negar verbas públicas para a Educação, para a Saúde, para a Ciência e a Tecnologia, como aliás não o é para qualquer dos setores em que o poder público tem funções a desempenhar. Sabem as autoridades quantos os artistas que têm feito três refeições por dia, desde que se instalou entre nós a covid-19? Quantos que, acometidos do mal, sobreviveram a ele e como têm seguido suas vidas agora repletas de constrangimentos? Nem se lembre aqui, por inoportuno, quanto faltou dinheiro nas horas mais críticas da pandemia. Manaus é exemplar, neste item. A asfixia, neste caso, não é figura de retórica, nem linguagem figurada. Também não se diga de respiradores e ventiladores adquiridos segundo as sofisticadas normas da má corrupção. Não há dinheiro para forçar a baixa do preço dos combustíveis, mas ele logo aparece, se algum comício precisa ser animado por nome conhecido na música popular. É de se perguntar, desta vez não ao Porchat: que história é essa? Pena que é a que vimos escrevendo.
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