Petrus Bar revisitado*
Pedro Galvão
Petrus Bar.
Assim chamavas, meu amor, dando risada
aquela távola de bravos beberrões
nessas noites brahmânicas de tramas
e conluios, conchavo, azaração.
Nós ali ao redor dos nossos sonhos
na mesa em que esta vida era servida
em pratos sujos e o futuro vinha
trazendo no cangote os velhos tempos,
os velhos novos tempos que criávamos
com mãos inábeis e ágeis e atrevidas.
Naquela mesa – vês? – o Inocêncio,
nosso jovem Caboco, ao lado o Bira
e mais o Zé Seráfico, o Zé Carlos
e este-um já embalado em redondilhas.
Palmério, sua alma e sua palma,
Paulo Chaves Fernandes, que fez tanto
por amor a Belém em cada canto.
Zé Otávio curte lá o Dave Brubeck.
Rosenildo põe layouts no papel.
Isidoro pega o riso, vai pro Rio
e é sempre o nosso Isidro do Batualê.
Cantando entra o Jesus com sua Viola
e o poeta Nei Leandro se faz mito:
é Ojuara e cavalga em zona erógena.
Monserrat, nosso grande temulento,
se embriaga sem beber, meu camarada.
Y, por supuesto, Cacho, Cacho Pérez,
es ya el parcerito de mi vida.
Mas quede, quedê Joaquim Francisco,
o nosso Joachã, onde andará?
Às margens do Rio Charles mais celeste
dando por lá seu adeus,
“seu longo adeus de inconsolados lenços”.
E onde, em que nuvem, o Abdelnor?
E o Cesar Bello, irmão, sonha que sonha?
Heitor, Heitor Dourado e sua aura?
O André Nunes, em que Terra do Meio
de que mundo? E o Aurélio do Ó?
Valter Bandeira? Canta com seus anjos
uma canção pra minha namorada?
E o Roberto Cortez? O Baratinha?
O nosso Guilherme Augusto, cadê?
Cadê o grão Estevão? E em que bar,
em que barra encontrarei Eduardo Iglesias?
Ah, é no céu que hão de estar,
no céu, no coração do Petrus Bar.
Aê rapaziada, todos vivos.
Alguns revendo Marx, trotskiando,
não entendíamos pículas de Gramsci
e buscávamos Teilhard de Chardin
entre contradições e ambivalências.
Saíamos para a noite sob a chuva,
mangueiras reluzindo no céu negro.
Todos vivos. Todos vivos e jovens,
uns belos, outros não, insaciáveis
de vida, de ousadia, de coragem.
Sorvíamos o tempo e no final
todos, um após outro, iam-se embora.
As luzes se apagando, meu amor,
restávamos nós dois engalfinhados.
E era bom amar bebendo o amor
até os sinos cantarem nas manhãs.
3.12.2019
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*Revisitado em junho de 2020.