Pode não ser – e certamente não é – uma unanimidade, mas Saramago é um grande escritor. Dos maiores. Para mim o maior, do século XX, em língua portuguesa. Variadas são as razões dos outros leitores, a justificar nenhuma simpatia pelo ganhador do Prêmio Nobel, 2003. De algumas, sei eu; outras, apenas intuo. Arrisco apresenta-las, e o risco vem da probabilidade de estar enganado ou de cometer flagrante injustiça. O que não me detém.
A primeira das restrições que me fizeram conhecer refere-se à escrita desobediente às exigências gramaticais. Texto sem vírgulas, períodos avessos à separação das orações, início de parágrafo com letra minúscula são as mais frequentes restrições ao escritor lusitano. Também tive essa impressão, à leitura da obra que me abriu a porta do trabalho do português auto-exilado em Lazarotte – A CAVERNA (Companhia das Letras, 2000). Não foi uma espécie de amor à primeira vista d’olhos. Precisei ler um outro livro dele, para só então fazer-me admirador e renitente leitor. Não sou de desistência fácil. As dúvidas ou incertezas não me fazem, necessariamente, recuar. Pelo menos, não à primeira frustração. Afinal, escolhi para meu epitáfio – e espero seja atendido – a frase: ele pode não ter conseguido, mas sempre tentou.
Pode ser até que, antes de ler O EVANGELHO SEGUNDO JESUS CRISTO (Companhia de Bolso, 2005) restasse em mim alguma reserva quanto à beleza do que vinha lendo. Bastou-me, porém, a narrativa do congresso humano entre Maria e José, do qual resultou o andarilho de Nazaré, para converter-me em leitor assíduo e voraz de José Saramago. Respeito a opinião, o sentimento e a preferência dos outros leitores, como espero merecer igual benefício de todos.
Nestes dias em que a CPI da covid-19 entretém 11 senadores e grande parte dos telespectadores brasileiros, lembro a obra Ensaio sobre a cegueira, do excelente escritor, onde há muito de premonição. Sem perder a ironia, Saramago discorre de vários dos vícios que, anteriores à cegueira generalizada, expõem certos vícios e defeitos humanos presentes na crise sanitária por que passamos. Pequeníssima parte das linhas encontradas nessa obra são transcritas em artigo publicado em meu espaço, nesta quinta-feira, 15 de julho de 202
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