É corrente certo discurso enviesado sobre a liberdade. Não se insere, porém, em quadro a que se possa negar coerência. Reiteradamente, temos visto e ouvido autoridades públicas justificarem o armamento da população em nome da liberdade do cidadão. Por justiça, haveremos de reconhecer que tal postura corresponde a certo modo de perceber o mundo e enfrentar os problemas que nos são colocados. Pode-se combater a fome com medidas que protejam todas as pessoas, de tal modo que não lhes falte alimento à mesa. Pode-se chegar ao mesmo resultado, porém, se todos os famintos forem assassinados. Em fornos crematórios, nas ruas ou nos hospitais sem oxigênio. Discutir-se-ia, aqui, o método, não a meta. Por isso, soa-me como exemplar o que li da pena do sociólogo (também comentarista de futebol) Juca Kfouri. Ele vê na aglomeração defendida, promovida e reiterada pelo Presidente da República e a grei que o serve, uma espécie de reivindicação. Os seguidores apenas se vinculam a essa estranha ideia de liberdade que consiste exatamente em impedir sejam livres os que deles discordam. No caso específico dos cuidados para prevenir a disseminação do novo coronavírus, Kfouri classifica os atos criminosos dos arrebanhados como reivindicação do direito de contaminar. Disseminam o vírus, não levando em conta o direito à vida de todos os demais. Há, contudo, alto grau de coerência e correlação positiva nessa trágica filosofia: quem se esforça por extinguir o Estado imagina-se Robinson Crusoé sem Sexta-feira.
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