top of page

Frustrações democráticas

Foto do escritor: Professor SeráficoProfessor Seráfico

Na marcha batida em direção ao passado, sendo buscada a ordem contra os mais fracos e o progresso andando para trás, tenta-se configurar o Brasil como uma pátria armada. Ponham-se armas nas mãos de todos, enfraqueçam-se as instituições públicas, destrua-se o Estado a que custo for, compensando as frustrações de Proudhon, Kropotkin e Bakunin. Teoricamente simpático à anarquia, não vejo em que ganharia a sociedade humana, se a cada um fosse dado o direito de agir segundo seus interesses individuais, sonhos pessoais, instintos animais. Seria necessário – e aqui está impossibilidade irremovível – que todos os indivíduos amadurecessem ao mesmo tempo e chegassem ao discernimento adequado dos fatos concomitantemente. Teríamos, então, um corpo social estagnado, impedido até de produzir sucessivas gerações. De uma criança não se podem exigir condutas que só a idade adulta em geral conquista. No entanto, vai em curso a tentativa de remover todo e qualquer obstáculo à voracidade com que muitos costumam tratar as coisas comuns (res publica, diziam os romanos) como se reservadas a parte ínfima da população. Aqui e alhures. A duras penas conquistada, a democracia, com todas as falhas e vícios que o ser humano a cria e orna, vê-se comprometida, sempre que o delenda status se move. A organização política e jurídica, assim vista, constitui-se território permanentemente açoitado pelos ventos do obscurantismo. Ostensiva ou mal disfarçada, vai-se fazendo passar a boiada, as patas tornando sáfaro e infértil o terreno onde a tenra planta democrática (assim a considerava Octavio Mangabeira) deveria produzir (bons)frutos. Não é isso o que vemos hoje. Enquanto o Congresso anuncia fartura exagerada de recursos públicos para os partidos, tenta-se promover a reserva dos postos eletivos apenas aos que têm dinheiro e fartura de bens. Se, no primeiro caso, a necessidade de serem fortalecidas as organizações partidárias – exigência da república e da representatividade popular - só se sustenta e ganharia legitimidade se modificadas as formas de distribuição da dinheirama, no outro a ameaça à própria democracia é de igual tamanho. Refiro-me, aqui, à pretensão de estabelecer o tal distritão. Neste, cairia por terra o princípio que assegura representatividade, pois o processo eleitoral faria reserva de mercado aos candidatos providos de polpudos recursos. Na distribuição do Fundo Partidário, mantidas as regras atuais relativas à participação de cada sigla na bolada provinda do Erário, ficaria comprometido, como tem sido, o princípio da rotatividade do poder. Este só seria alcançado se a cada partido coubesse um avo do valor total. O que significa igualar o direito de ascender ao poder a qualquer deles, desde que convencidos os eleitores durante a campanha. Colocar o guiso no pescoço do gato, como a experiência mostra, não é tarefa das mais fáceis.

2 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

França e franceses

Mais uma vez vem da França o anúncio de novos avanços na História. Esta quinta-feira marca momento importante daquela sociedade, há mais...

Uso indevido

Muito do que se conhece dos povos mais antigos é devido à tradição oral e a outras formas de registro da realidade de então. Avulta nesse...

Comments


bottom of page