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FORMAS E FUNÇÕES

Foto do escritor: Professor SeráficoProfessor Seráfico

Orlando Sampaio Silva*


Este texto tem a ver com estudos de sexologia e sexualidade, e se fundamenta em constatações científicas nos campos da anatomia e da fisiologia. As considerações desenvolvidas se concentram nos seres humanos, animais ditos superiores, mamíferos. Os achados de esqueletos de hominídeos, nas pesquisas da antropologia física e da arqueologia humana, que oferecem indícios da presença do ser que veio a ser o humano, inscrevem-se em um período entre do 3,5 a 4 milhões de anos. O processo evolutivo, nos primeiros tempos, predominantemente biológico, com o passar do tempo, também veio a ser sociocultural. Ele teve, em suas formas mais ancestrais, na gênese reprodutora, impulsos vitais assexuados (estes estavam ainda em fase “embrionária”, em início de constituição), como produto de transformações de células e moléculas, que se uniam e se organizavam reprodutivamente, em grande variedade de sistemas referentes à biogênese. Este processo foi quantitativamente crescente, multiplicador. No bojo desse processo, foram surgindo as diferentes espécies de seres vivos. Estas vieram a se subdividir em variadas categorias biológicas, entre as quais os invertebrados e os vertebrados. O ser humano pertence a esta segunda categoria.

Com a evolução biológica se foram consolidando as formas e os processos reprodutivos. Na grande maioria das espécies - mamíferos, peixes, aves, batráquios, quelônios etc. – e no interior de cada espécie, delineou-se um sistema reprodutivo composto ou misto, no qual os seres se dividiram segundo dois sexos, os machos e as fêmeas, na espécie humana, os homens e as mulheres. Para a preservação das espécies, esse sistema sexual binário foi o fulcro da possibilidade de as espécies se reproduzirem, sobreviverem, se manterem e multiplicarem-se.

Nos seres vivos foi desenvolvido um instinto preservativo e de sobrevivência das espécies, em meio ao qual os seres agem inconscientemente, porém, sempre conduzidos por uma força vital, que se impõe de forma incontrolável. Nesse complexo sistema reprodutivo bissexuado, os dois seres, o macho e a fêmea, sentem uma necessidade, um impulso que os levam aos encontros de sujeitos dos dois sexos e, nestes, aos atos reprodutivos.

A atração, o encontro e os consequentes atos reprodutivos, certamente por serem cruciais e vitais à sobrevivência das espécies, contêm em si sensações estimulantes de incontidos prazeres, de voluptuosidade, que atuam em si como impulsos de difícil controle racional (no ser humano), os quais apenas encontram a possibilidade de controle com a sublimação, ou seja, em atos substitutivos, que se colocam no lugar do prazer sexual, tais como as práticas artísticas, as esportivas, as religiosas etc. Estou lidando, nesta explanação, com situações, digamos assim, de normalidade na sexualidade. A repressão, o medo, o nojo, pré-noções, fanatismos religiosos, exarcebações de ordem moral ou ética, podem interferir como instrumentos de contenção ou controle dos atos referentes ao instinto sexual.

Os prazeres nas práticas sexuais (centro-me nos seres humanos) são sentidos por homens e mulheres como sensações nervosas que percorrem o sistema nervoso sob o impulso de estímulos externos ao corpo. Estes estímulos são sentidos por intermédio dos cinco sentidos, mas principalmente pelo tato. Este é receptivo às carícias e outros estímulos na pele e nas mucosas, que são levados pelos filamentos nervosos ao cérebro, de onde emanam as reações internas e externas, criando nos personagens condições para as práticas de ações e atos, no campo sexual, movidos por prazeres de variadas intensidades, entre os quais os orgasmos masculino (ejaculação, gozo, com grande sensação de prazer, que percorre o corpo) e feminino (com o umedecimento vaginal e estados de extremo prazer, que se expande por todo o corpo), manifestação de gozos intensamente prazerosos.

Se o instinto sexual está ligado ao fenômeno da reprodução, os prazeres das práticas sexuais não se restringem apenas às relações reprodutivas. Nestas, a ação reprodutiva está associada intrinsecamente ao prazer sexual, mas as relações sexuais e os prazeres ligados aos sexos vão além daquela função de reprodução. O erotismo e a voluptuosidade decorrem desses prazeres e/ou são causas desses prazeres. As duas hipóteses são válidas. O corpo humano todo ele se constitui em uma zona erógena total, de vez que o erotismo pode ser estimulado na totalidade da pele e das mucosas, mediante o contato direto entre os corpos do homem e da mulher. Este estímulo também, ocorre por intermédio da imaginação, das fantasias, das criações eróticas processadas no cérebro. A visão dos corpos desnudos do homem e da mulher, a contemplação de cenas de sexo ao vivo ou em fotos ou nas projeções de películas cinematográficas etc. atuam como estímulos eróticos e convidativos às efetivações de diferentes formas de atos sexuais. Os estímulos nervosos eróticos conduzem o homem e a mulher à excitação, com o aumento da vascularização nos órgãos sexuais, tendo lugar o consequente entumecimento, principalmente no homem (pênis erectus: endurecimento, aumento do tamanho e engrossamento temporários do pênis).

Nos corpos do homem e da mulher há os chamados órgãos reprodutores internos e externos, os quais são conectados com determinadas áreas, que são denominados órgãos sexuais, o pênis masculino e a vagina feminina, localizados nas assim consideradas zonas erógenas do corpo.

No processo reprodutivo constituído ao longo da evolução biológica, a gênese dos novos seres decorre de um compartilhamento reprodutor do homem e da mulher. A função reprodutora geral foi dividida na parte funcional que é reservada ao homem e sua contrapartida própria da mulher. O homem produz no testículo (no epidídimo) os espermatozoides (gametas masculinos, hormônios masculinos), células reprodutoras masculinas, e a mulher é portadora do ovário, nicho onde são produzidos os óvulos (gametas femininos, hormônios femininos), células reprodutoras femininas. Os espermatozoides, no processo da ejaculação, deslocam-se para a próstata, onde, com as complementações do líquido seminal (produzido pela vesícula seminal) e de outros componentes originários na própria próstata e da glândula bulbouretral, é formada o esperma. No esperma se encontram os espermatozoides.

Também no processo reprodutor de uma nova vida, cabe ao homem a função de fornecedor (ou depositador) das células reprodutoras masculinas, que estão no esperma, no interior do corpo da mulher, dentro do seu órgão genital. A mulher, portanto, tem a função de receptora do esperma. Em face destas diferentes funções, no processo evolutivo biológico, o homem foi dotado de um instrumento cavernoso (ou seja, o pênis), que é provido de um canal estreito excretor, a uretra, e a mulher, de um canal tubular mais largo (dado às suas diversas funções), que liga as partes exteriores da vagina (onde se encontram os grandes e pequenos lábios etc.) ao útero.

Como foi visto acima, os atos e relações sexuais humanos não se restringem à função reprodutora. Tendo em vista a afetividade, o sentimento amoroso, ou a simples atração física, e o casal objetivando a satisfação, a excitação, o prazer, o gozo, que os jogos sexuais, todos eles, propiciam aos participantes, esses atos e essas relações também são praticados sem objetivos procriadores. O pênis desempenha sua função na ação procriadora na relação vaginal. Porém, ele também participa de relações vaginais sem o fim procriador (neste caso, com os cuidados anticoncepcionais para evitar a fecundação ou fertilização), e, de outras formas de relações sexuais nas quais a penetração peniana na mulher se dá em outras áreas de seu corpo também com forma tubular ou semelhante, sendo esta forma necessária a que ocorra o prazer sexual. Estas relações são: a relação sexual oral (com a sugação) e a relação sexual anal, podendo haver ainda a relação manual masturbatória (a mão da mulher assumindo uma forma tubular e se movimentando), e outras formas, tais como - o coito interrompido, o coito entre as coxas, o coito entre os seios...

No processo reprodutor, no corpo da mulher, o óvulo se desloca do ovário para o útero, e o homem deposita o esperma na vagina “à porta” do útero, que neste penetra. No interior do útero, dá-se o encontro das células reprodutoras masculina e feminina, tendo lugar o fenômeno ontogenético da fertilização do óvulo, formando o zigoto, tendo início à formação (ou “criação”) de um novo ser do sexo masculino ou do sexo feminino. Cabe à mulher a função extraordinariamente sublime de ser o centro constituidor e protetor deste novo ser, mistério da vida que apenas as mulheres têm o privilégio de protagonizar.

(S. Paulo, 24/03/2023)


*Antropólogo sociocultural.



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