Foi-se a república

Estranha é o mínimo que se pode dizer da decisão do Supremo Tribunal Federal a respeito da laicidade do estado. Essa, foi, todavia, a interpretação dada pela maioria da nossa mais alta Casa de Justiça, ao decidir sobre a presença de imagens denotativas de preferência por este ou aquele credo religioso. Tratava-se de decretar a inconstitucionalidade da manutenção de imagens religiosas - ou não - em face do que dispõe o artigo 19 da Lei Maior, que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público. Entendo mal interpretada a expressão cultos religiosos, a meu juízo desatenta ao conteúdo e acepção do que a ele corresponde na vida real. O culto a uma religião não se esgota nos atos de que participam os fiéis a determinado credo, se não que se estende a toda forma de reverência às imagens e preceitos correspondentes a uma crença religiosa. No Brasil, em que ainda é católica a maioria dos habitantes, pode-se esperar mais cedo do que se imaginaria pouco anos antes, venham as seitas evangélicas a constituírem-se majoritárias. Hoje, quase toda organização pública, o próprio STF dentre elas, ostenta uma imagem de Jesus Cristo, talvez o homem mais importante de toda a História. Isso não justifica, porém, a aposição da imagem do nazareno nas paredes de órgãos de uma república. Laica, por definição e segundo o ideal de Montesquieu. Com a interpretação recentemente expedida pela maioria do Supremo, logo teremos a necessidade de criar uma galeria para receber e expor as imagens de outras religiões. Não faltará quem proponha isso, dada a percepção enviesada e o desprezo pela república, como a viam seus pais fundadores e como as veem as gerações que sucederam a do filósofo e ensaísta francês. A Jesus Cristo farão companhia, é quase certo, Alá, Buda, Shiva, quem sabe até Silas Malafaia, Edyr Macedo e outros demoníacos deuses que ainda hoje vivem na Terra.