José Alcimar de Oliveira *
Eu vim lançar fogo sobre a terra, e como gostaria que já estivesse aceso! (Jesus de Nazaré).
01. Trabalhar a comunicação, a comunicação com o povo, é fundamental para o governo Lula se assenhorar do poder. Governo sem poder não governa. Poder sem comunicação não se legitima. E a extrema direita, que já mostrou a que veio, sabe muito bem disso. A comunicação, orientada pela formação política do povo, pelo bom senso ético e pela justiça, deve ser absolutamente priorizada. O campo político não admite vácuo. É certa a sabedoria popular: mente vazia, oficina de Satanás.
02. Segundo Santo Agostinho, que nas palavras do irredento István Mészáros é o autor da “maior filosofia da história de inspiração religiosa”, Sobre a Cidade de Deus (De Civitate Dei), quando desaparece o senso de justiça, o que são os Estados, senão um bando de ladrões? (remota itaque justitia, quid sunt Regna nisi magna latrocinia?). Não há como o Brasil desviar-se da rota do atual abismo sem que seja despertado do sono dogmático, condição primeira para recuperar o senso de realidade.
03. A direita, que tem uma unidade de raiz, soube trabalhar o vazio ideológico deixado pelos quatro mandatos do PT. Miséria social nunca gerou consciência de classe. Apartadas da formação política, as políticas compensatórias e a inclusão pelo consumo jamais produzirão consciência de classe. Não sou filiado ao PT e posso dizer que o melhor de minha formação política se deu no PT, sobretudo nas tendências ligadas ao trabalho de base da Igreja católica. A força do PT vem das bases da sociedade de classes.
04. Sou do tempo dos agentes da pastoral popular. Desdenhados por setores das ditas vanguardas, eram carimbados como “igrejeiros" e vistos com desconfiança pelas correntes do PT mais à esquerda da luta classista. Os intelectuais de esquerda, por sua vez, priorizaram o debate acadêmico e deixaram o proletariado à deriva. Prevaleceu o conforto da teoria e a direita sentiu-se à vontade para fazer o trabalho sujo e envenenar a consciência do povo com o discurso moralista e hipócrita de combate à corrupção.
05. O PT foi eleito como objeto do ódio de classe ao proletariado, cultivado pela burguesia brasileira, que mobilizou as forças mediáticas e o poder da mendacidade para armar a engenharia do golpe de 2016. A direita fez a semeadura do ódio, mas a colheita dos frutos envenenados ficou com a extrema direita nas eleições de 2018. Para pensar com o impenitente e saudoso Mészáros, o PT e as forças de esquerda têm diante de si o desafio de conquistar a montanha do Estado ocupado pela extrema direita.
06. Vejo como desavenças ideológicas menores as disputas entre Pastoral Popular e tendências no interior do PT. Foi no interior da própria Igreja Católica que ocorreu a mais orgânica hostilização à Pastoral Popular, promovida pelo combinado Reagan-João Paulo Il, de mãos e mentes dadas para destruir a Igreja que brotava das bases, animada pela Teologia da Libertação. O poderoso combinado anticomunista logrou êxito. Quem viveu os meados das décadas luminosas de 1970-1980 sabe disso. Recuperar a história para fortalecer as lutas do presente é o que se nos impõe.
07. Tempos de militância luminosa, de formação política com os subalternizados, à luz da Teologia da Libertação: Pastoral Operária (PO), Pastoral da Terra (CPT), Pastoral Indígena (CIMI), para citar as principais. Tempo das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), dos Círculos Bíblicos. Quando o PT assumiu o governo (não o poder) em 2003, o trabalho de base da Igreja já estava desmontado e o espaço político (religioso, ideológico) dominado pelo neopentecostalismo empresarial. Navegar é preciso.
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*José Alcimar de Oliveira é professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Amazonas, teólogo sem cátedra, segundo vice-presidente da ADUA-Seção Sindical e filho do cruzamento dos rios Solimões e Jaguaribe. Em Manaus, AM, aos 06 de novembro do ano da virada de 2022.
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