Seja qual for a razão, os brasileiros parecemos acostumados a optar sempre pelo menos pior. Algo próximo da situação do náufrago sem alternativa diante de um pedaço de papelão flutuando em torno dele. Com a esperança de que uma embarcação
possa resgatá-lo. Como se o abismo iminente também o fosse permanente. A fábula de Sísifo por séculos reiterada. De crise em crise, do abismo de agora ao abismo de amanhã, vão-se construindo acordos repugnantes, espúrios, incapazes de superar a realidade que incomoda a maioria da população. Ameaçando, inclusive, o processo que tende a desapear do poder o fascismo em curso. Embora criticada por gregos e troianos, conservadores e progressistas, a prática do toma-lá-dá-cá permanece intocada. Dela provêm e se alimentam os acordos e acórdãos que impedem a sociedade de ver resolvidos seus mais urgentes problemas. Neste momento, acumulam-se os sinais de um desses conluios, voltado à reiterada observação de Giuseppe Tomaso de Lampedusa: mudar para que tudo fique como está. O suposto arrependimento do Presidente da República, em relação às afirmações injuriosas com que se refere a pessoas, fatos e relações que envolvem pessoas, instituições ou interesses que ele rejeita; a declaração de estar disposto a entregar o posto ao eleito pelas mesmas urnas que o levaram ao Planalto, e que ele tem como fraudáveis; a cavilosa sugestão do articulador principal do golpe contra Dilma, no sentido de anistiar o patrono da mentira, como se esse fosse crime mais grave que as rachadinhas, a ofensa reiterada à Constituição; o uso de auxílio-moradia para comer gente, como o registra o palavreado grosseiro do Presidente; o desmonte de órgãos de controle como PF, IBAMA, a proteção a familiares e amigos denunciados pela suposta prática de crimes, de que dão testemunho a decretação de sigilo, a obstrução de investigações e a tentativa de desmoralização de órgãos da máquina
pública; o descarado envolvimento do dinheiro público em sua campanha eleitoral; a atração por Lula desde Geraldo Alckmin até Henrique Meirelles e Augusto Aras - tudo isso e muito mais do que vem sendo noticiado deixa claro. Por isso, junto com o apoio ao candidato do Partido dos Trabalhadores deve vir vigorosa campanha para frustrar a sentença de Lampedusa. A anistia que estimulou a transformação de torturador em herói não pode ser repetida. E, caso eleito, Luís Inácio Lula da Silva só terá merecido o voto dos resistentes ao fascismo se, na primeira semana de governo revogar os decretos de proteção e estímulo ao armamento da população. De igual modo, tornar letra morta todos os atos que acobertam delitos com um centenário de sigilo. Depois, a promoção das investigações dos atos praticados com interferência direta do atual Chefe que substituirá, e seus círculos mais próximos, a começar por seus familiares. A movimentação dos interessados na anistia que pune a virtude e estimula o vício e o crime não pode prosperar. As urnas caberá dizê-lo, daqui a 5 dias.
Comments