Jorge Bandeira
Eu não esquecerei você, artista que cantou ao adorador do torturador Ustra
Eu não esquecerei você, artista que usou as redes sociais para diariamente espalhar o ódio mesmerizado sob uma maquiagem exagerada
Eu não esquecerei de sua arte mancomunada de regionalismo estéril
Eu não esquecerei de seu humor debochado com os homossexuais
Eu não esquecerei de sua música maquiada de rastafarianismo para se passar de revolucionário
Eu não esquecerei de teu porte de arma
Eu não esquecerei de tua arma apontada para os pobres
Eu não esquecerei de seu teatrinho infantil costumizado de suásticas em forma de cata-ventos
Eu não esquecerei jamais de você em frente ao Comando Militar da Amazônia de novembro até 9 de janeiro
Eu não esquecerei de tuas aparições com um bigode estatal do tamanho de teu preconceito
Eu não esquecerei que mesmo assim tua lista de amizade praticamente não mudou nos últimos 6 anos
Eu não esquecerei de tua isenção confortável
Eu não esquecerei de teus quadros que emolduraram novelas
Eu não esquecerei de tua biblioteca Olavo de Carvalho
Eu não esquecerei de tuas opiniões políticas como motorista de aplicativo ouvinte da Jovem Pan
Eu não esquecerei deste teu Deus bondoso com fascistas e genocidas
Eu não esquecerei das drogas que usas e que combates nos outros
Eu não esquecerei que em breve estará você em busca dos editais e das leis culturais que combatias enfaticamente
Eu não esquecerei que antes, ao estares fora do governo, eras um guerreiro altivo
Eu não esquecerei das toadas folclóricas que falsamente enalteciam os povos originários
Eu não esquecerei que tuas mirações eram apenas sonhos passageiros de alguém fermentado no conservadorismo
Eu não esquecerei o brilho em teus olhos a cada motociata da morte
Eu não esquecerei de teu silêncio após o segundo turno
Eu não esquecerei (aliás, guardei como print eterno) que dois dias antes já convocavas aos teus para o 8 de janeiro
Eu não esquecerei de tua fúria metaleira que é cega e machista
Eu não esquecerei do choro de teus filhos e filhas
Eu não esquecerei que até hoje tuas postagens continuam insuflando o nada
Eu não esquecerei o teu desprezo aos Yanomamis
Eu não esquecerei que ao passar por ti pelas ruas devo desviar meu caminho
Eu não esquecerei
Domingo de chuva.
Manaus, 12 de fevereiro de 2023
__________________________________________________________________________________*O autor é ator, dramaturgo, diretor teatral. Em Manaus, onde reside, Jorge Bandeira encenou inúmeras peças, dos mais diversos autores modernos. Dentre eles, Beckett, e Brecht. É autor de Psicose Magaiver 20 e Cabeças Decapitadas, dentre outras peças.
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