top of page

Deus, Pátria, Família – o PL 1904/24

Foto do escritor: Professor SeráficoProfessor Seráfico

Sei eu, sabem todos os que acompanham os fatos. E se preocupam com o futuro da sociedade. Em especial, os que têm olhos atentos postos nas mudanças que vêm ocorrendo nas últimas décadas. O lema “Deus, Pátria e Família” viaja pelo Mundo desde o século passado. Alimentou desvairados sonhos, e se pensava tê-los derrotado e devolvido às profundezas de onde emergiram, depois da II Grande Guerra. O nazismo alimentado pelo slogan nunca mais incomodaria a sociedade humana. Ledo engano!

Se a derrota no teatro de operações da guerra fora reconhecida, o mesmo não pode ser dito, se se trata de observar a ressurreição da ideologia representada na tríade – Deus, Pátria, Família.

Deus, a única resposta para a pergunta irrespondível, já nem pode ser mais pensado como um ser superior, barbas brancas descendo-lhe do queixo, a propagar o Amor e a Fé. Não lhe bastasse a multiplicidade de formas e mensagens que Lhe são atribuídas. Nem é de admirar que, sociedade confundida com o mercado, logo não se estabelecesse feroz competição. Falar de Deus, portanto, dizer-se por Ele orientado, confessar-se fiel a Ele não basta. Tantos os deuses em circulação, tamanhas as diferenças entre eles, tão feroz e odienta a pregação, que o Amor cede lugar ao ódio; a tolerância deixa-se superar pelo fanatismo.

Afinal, de que deus estamos falando? D’ Aquele inspirado no andarilho de Nazaré, em Alá, em Abrahão, Tupã ou aos muitos deuses postos a circular em todos os lugares, à moda da franquia que enriquece mercenários de toda espécie?

Como ignorar as sessões de extorsão, praticadas em estabelecimentos comerciais onde fanáticos são submetidos à coação emocional que lhes promete o fogo infernal, caso recusem o pagamento com a chamada vil moeda? Como chamar de religião o culto à gritaria, o estardalhaço em lugar do recolhimento, o ódio proclamado a tudo quanto se revele diferente?

Qual a pátria de que falam os sucessores de Hitler e Goebbels (sem esquecer dos outros – Eichmann, Göring, Hess, Himmler, Mengele etc.): aquela onde repousam as cinzas ou o pó de nossos ancestrais, ou as nações poderosas capazes de pagar o preço de nossa infidelidade e traição aos compatriotas? Pois os mesmos venais que usam a tríade verbal maldita têm compensado sua fraqueza de caráter e sua pequenez humana por essa conduta. Como a ilustrar a diferença de que tão sabiamente tratou Erich Fromm. Ao ser humano deram preferência a ter bens materiais. Mais uma vez, essa a opção dos (vá lá o lugar comum!) vendilhões da Pátria. Põem a perder, se um dia tiveram conhecimento dele, o que disse Joaquim Manuel de Macedo, em seu quase totalmente esquecido texto O Torrão natal. Ainda mais quando o avanço das comunicações lhes permite, a um só tempo, aproximar-se de mercados (em qualquer sentido, aqui) onde calculam obter a dinheirama que sua má índole ambiciona, em qualquer parte do Planeta. Uma forma de globalizar também suas inclinações malévolas, levar a todos os lugares onde podem ter ainda mais, destituídos absolutamente da noção do ser. Humano, nem pensar...

De qual família falam os fiéis à proclamação nazifascista? Daquela oriunda do patriarcalismo antigo, ou da que justifica a expressão com que se esclarecem os laços familiares, as relações entre pais e filhos, neste mundo tão desigual – os meus, os teus, os nossos?  Não que o divórcio não seja, em grande medida, solução adequada aos que buscam a felicidade e a proteção dos descendentes. Às vezes, até, para prevenir mal maior. Sem esquecer quantos o matrimônios, às vezes multiplicados, que resultam em quadrilhas, não em famílias. Patrimônio sendo o resultado, tenha ou não dado origem à prole.

No momento, os mesmos que dizem defender a vida humana trocam o ser pelo vir-a-ser. Proclamam as virtudes dos estupradores, mesmo sabendo-os integrados (irmãos, pais, tios, avôs) ao grupo familiar de que participa sua vítima. Não lhes importa o sofrimento da menina que engravida e terá um filho produto do desamor e da violência. Um ser rejeitado, e não me digam sem razão suficiente para ser esse o sentimento da estuprada. Nada lhes incomoda, hipócritas como o são. Nem se desdenhe ou considere dispensável cogitar da probabilidade de coincidirem os defensores da punição da vítima com autores do crime que dizem condenar. Mentira, mentira, mentira!

Procure-se sem lupa tão forte, porque desnecessária, quantos dos defensores da condenação da vítima de estupro terão cometido igual ato. Então, surge o que tentam fazer passar por compensação: agravar a pena dos estupradores, mesmo mantendo punição para a vítima dele.

É dessa família que estão falando? Ou isso tudo não passa de uma farsa, porque o melhor é deixar estuprar, porque pior é a morte. Como disse político de trágica e nojenta fama: estupra mas não mata! Lembram-se dele? Pois tem tudo a ver com os que patrocinam, defendem, empenham-se em ver aprovado o PL 1904/24.

 
 
 

Posts recentes

Ver tudo

Declive

Enquanto no Brasil se afunila o processo que, segundo a expectativa dos melhores juristas, levará à passagem dos terroristas de 08 de...

Anômico, também anêmico

Uma sociedade entregue à vontade individual, em que as relações sociais rejeitassem regramento aplicável a todos, certamente seria uma...

Zumbis iminentes

A baixíssima frequência ao comício de domingo passado, convocado pelo quase-réu a que o STF atribui a liderança de uma quadrilha, permite...

Comments


bottom of page