Discutir a crise de nada adianta, se não nos afastarmos da polarização que opõe fanáticos de um lado e do outro. Entender os fatos políticos e extrair deles o significado mais próximo da realidade é o grande desafio. Por crises quase todas as nações passam, em algum ponto de sua trajetória. Em todos os casos, a resposta é mais importante que a própria configuração sócio-política. A resposta depende, portanto, das lideranças política, econômica, acadêmica, militar, religiosa, operárias e outras – se isso basta para descrever toscamente a sociedade por seus segmentos diferenciados. O modo como os diversos agentes reagem é que diz da capacidade de gerar reais probabilidades de bom desenlace. Mesmo que nem todos consigam relacionar uma coisa – a crise e seus componentes – e outra – os potenciais solucionadores das questões que a crise põe, arrisco comentar o que penso ser o maior obstáculo à boa solução para evitar o abismo que se avizinha. Desde janeiro de 2019, testemunhamos uma trajetória governamental que a uns dá a impressão de nau sem rumo; outros consideram essa uma percepção ingênua, que a nada levará. Nem teremos resolvidos nossos problemas, nem conseguiremos responsabilizar por quem eles tanto fez. Se a memória funciona, todos devem lembrar-se dos primeiros dias do atual governo,, em que ficou marcada certa afirmação do Presidente. Ele disse, então, não estar preparado para as exigências do cargo. Apostou todas as fichas nas ideias desencontradas de um astrólogo e nas supostas virtudes acadêmicas de um egresso da Escola de Chicago. Isso, todavia, não combinava, para o bem ou para o mal, com o que ele mesmo havia apregoado durante a campanha eleitoral. Seria introduzir em seu governo um mínimo de racionalidade, este fruto que parece azedar sua alimentação. Disso tratei em texto anterior, no qual trazia de volta a figura de Peter Townsend, autor do livro Todo mundo é incompetente, inclusive você. Nas páginas, uma afirmativa que, aparentemente jocosa, diz bem da nossa situação: em todas as organizações, todos têm o momento em que cessa sua competência. Algo como dizer que não se faz com madeira um anel de ouro, na expressão por mim forjada. Ou nem sempre o bom vendedor será um bom supervisor dos vendedores. Talvez os empresários saibam dizer isso de melhor e mais ponteira forma. Veja-se hoje a situação do Presidente. Dia a dia esforçando-se por desmentir tudo o que disse em campanha, ele se dedica a engendrar formas e fórmulas mais do que atentatórias aos direitos individuais e coletivos, próprios de uma democracia, mais forte ela seja. E não é esse o nosso caso. A hesitação presidencial não é gratuita, como o constataria Peter Townsend. Por isso, o Brasil assemelha-se à nau sem rumo, em meio às vagas crescentes e ameaçadoras. Outro, de cujo nome não lembro, se não é apenas um dito popular, traduziria tudo como o barco perdido, bem carregado. Nem a ajuda do vírus satisfaz ocorrendo de ser o vírus o ajudado.
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